{"id":2039,"date":"2017-12-02T10:01:07","date_gmt":"2017-12-02T12:01:07","guid":{"rendered":"https:\/\/chenut.online\/?p=2039"},"modified":"2017-12-02T10:01:07","modified_gmt":"2017-12-02T12:01:07","slug":"a-importancia-do-compliance-na-execucao-de-contratos-administrativos","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/chenut.online\/a-importancia-do-compliance-na-execucao-de-contratos-administrativos\/","title":{"rendered":"A import\u00e2ncia do Compliance na execu\u00e7\u00e3o de contratos administrativos"},"content":{"rendered":"
[:br]<\/p>\n
O Brasil est\u00e1 vivenciando uma desastrosa situa\u00e7\u00e3o social, pol\u00edtica e econ\u00f4mica em decorr\u00eancia dos malfadados epis\u00f3dios de corrup\u00e7\u00e3o que se repetem diariamente em todos os cantos e poderes do pa\u00eds.<\/p>\n
A opera\u00e7\u00e3o \u201clava jato\u201d e os seus desdobramentos demonstram claramente – como se isso fosse novidade – que a contrata\u00e7\u00e3o p\u00fablica no Brasil \u00e9 majoritariamente (qui\u00e7\u00e1 integralmente) regida pela corrup\u00e7\u00e3o, uma vez que o direito de executar os contratos administrativos deixou de ser daqueles particulares que re\u00fanem as condi\u00e7\u00f5es de habilita\u00e7\u00e3o necess\u00e1rias e ofertam o melhor pre\u00e7o.<\/p>\n
Viu-se na pr\u00e1tica que a assinatura dos contratos \u00e9, h\u00e1 tempos, ditada em sua grande maioria pelo montante de propinas e subornos pagos, bem como pela influ\u00eancia de certas empresas dentro do congresso nacional e do executivo.<\/p>\n
Naturalmente, a exposi\u00e7\u00e3o midi\u00e1tica de tais fatos encorajou ainda mais a discuss\u00e3o da corrup\u00e7\u00e3o nas licita\u00e7\u00f5es p\u00fablicas, ou seja, na fase pr\u00e9-contrata\u00e7\u00e3o. Todavia, um certame realizado dentro da lei n\u00e3o garante, por si s\u00f3, a supera\u00e7\u00e3o da corrup\u00e7\u00e3o, na medida em que a execu\u00e7\u00e3o contratual abre um enorme espa\u00e7o para a efetiva\u00e7\u00e3o de conluios objetivando a satisfa\u00e7\u00e3o ileg\u00edtima de interesses particulares.<\/p>\n
Nesse cen\u00e1rio, o objetivo do presente artigo \u00e9 justamente analisar, ainda que brevemente, esse segundo momento para a pr\u00e1tica de atos de corrup\u00e7\u00e3o ou \u00edmprobos, a fim de demonstrar a import\u00e2ncia da implementa\u00e7\u00e3o, tanto pelas empresas quanto pelo pr\u00f3prio governo (federal, estaduais e municipais), de um efetivo programa de compliance que tamb\u00e9m abranja ferramentas espec\u00edficas capazes de mitigar os riscos existentes no \u00e2mbito da execu\u00e7\u00e3o de contratos administrativos.<\/p>\n
Pois bem. Existem tr\u00eas important\u00edssimos fatores no \u00e2mbito da execu\u00e7\u00e3o de contratos p\u00fablicos que permitem – em potencial – o alastramento da corrup\u00e7\u00e3o e improbidade, a saber, (a) exist\u00eancia de cl\u00e1usulas exorbitantes, (b) falta de fiscaliza\u00e7\u00e3o e (c) desrespeito \u00e0s normas or\u00e7ament\u00e1rias. Passa-se, pois, a discorrer sobre cada um desses elementos.<\/p>\n
Cl\u00e1usulas exorbitantes<\/strong>. O direito administrativo brasileiro teve como um princ\u00edpio basilar a supremacia do interesse p\u00fablico sobre o privado, sendo um dos desdobramentos desse princ\u00edpio a participa\u00e7\u00e3o da Administra\u00e7\u00e3o P\u00fablica nos contratos administrativos com privil\u00e9gios, ou supremacia de poder.<\/p>\n Na pr\u00e1tica, o reflexo disso \u00e9 a exist\u00eancia de cl\u00e1usulas exorbitantes nos contratos, justificadas pela doutrina tradicional a partir da necessidade de se garantir uma posi\u00e7\u00e3o de supremacia da Administra\u00e7\u00e3o P\u00fablica sobre o contratado e a preval\u00eancia do interesse p\u00fablico sobre o particular.<\/p>\n Com efeito, a Lei n\u00ba 8.666\/93[1]<\/a> prev\u00ea v\u00e1rias prerrogativas que permitem que a Administra\u00e7\u00e3o altere o originalmente pactuado com o particular e reestabele\u00e7a unilateralmente o curso da contrata\u00e7\u00e3o.<\/p>\n Para exemplificar, vale citar que a Administra\u00e7\u00e3o pode (i<\/em>) decidir se ir\u00e1, de fato, contratar com o vencedor da licita\u00e7\u00e3o, (ii<\/em>) alterar unilateralmente o contrato, inclusive os quantitativos e cronograma de execu\u00e7\u00e3o[2]<\/a>, (iii<\/em>) suspender\/atrasar os pagamentos por at\u00e9 noventa dias sem qualquer consequ\u00eancia[3]<\/a>, (iv<\/em>) impor severas san\u00e7\u00f5es ao particular sem um efetivo sistema de contrapeso[4]<\/a> e (v<\/em>) rescindir unilateralmente o contrato[5]<\/a>.<\/p>\n A exist\u00eancia de tais prerrogativas permite que a situa\u00e7\u00e3o do particular seja definida pela escolha de um agente p\u00fablico que, por certo, deveria pautar-se nos princ\u00edpios que norteiam a atividade administrativa[6]<\/a> e na busca pela efetiva\u00e7\u00e3o do interesse p\u00fablico, mas, em grande parte das vezes, faz uso desse espa\u00e7o para obter vantagens il\u00edcitas.<\/p>\n Nas palavras de Mar\u00e7al Justen Filho[7]<\/a> \u201ca corrup\u00e7\u00e3o decorre das oportunidades ofertadas pelo Direito para escolhas prepotentes do agente p\u00fablico. Sempre que o agente estatal dispuser de compet\u00eancia para escolher entre mais de uma alternativa, alguma das quais \u00e9 desfavor\u00e1vel ou favor\u00e1vel ao particular, surgir\u00e1 potencial oportunidade para a corrup\u00e7\u00e3o. E o Direito Administrativo brasileiro \u00e9 repleto dessas previs\u00f5es. Isso tem a ver com as condi\u00e7\u00f5es an\u00f4malas da execu\u00e7\u00e3o do contrato. \u00c9 o chamado regime das prerrogativas extraordin\u00e1rias, que contemplam poderes unilaterais para o agente realizar uma escolha.\u201d <\/em><\/p>\n As raz\u00f5es para tanto, ou seja, para a escolha de se praticar um ato de corrup\u00e7\u00e3o ou improbidade, podem ser, em resumo, encontradas na hist\u00f3ria da constru\u00e7\u00e3o da sociedade brasileira[8]<\/a>, mas este n\u00e3o \u00e9 um tema para o presente artigo.<\/p>\n De toda sorte, fato \u00e9 que a supremacia estatal no \u00e2mbito contratual, ou, noutros termos, a falta de isonomia entre a Administra\u00e7\u00e3o P\u00fablica e o particular, abre imensur\u00e1veis brechas para a pr\u00e1tica de il\u00edcitos.<\/p>\n Desrespeito \u00e0s normas or\u00e7ament\u00e1rias. <\/strong>Apesar da Constitui\u00e7\u00e3o Federal[9]<\/a> e da Lei n\u00ba 8.666\/93[10]<\/a> garantirem, respectivamente, que toda despesa deve estar vinculada a um recurso pr\u00e9-existente e o respeito \u00e0 ordem cronol\u00f3gica dos pagamentos, sabe-se que tais comandos legais n\u00e3o s\u00e3o observados. H\u00e1 ainda, como visto acima, previs\u00e3o legal que possibilita o atraso dos pagamentos por at\u00e9 noventa dias sem qualquer consequ\u00eancia.<\/p>\n Ora, n\u00e3o \u00e9 raro que a Administra\u00e7\u00e3o fa\u00e7a uso de artif\u00edcios cont\u00e1beis[11]<\/a> e se beneficie das suas pr\u00f3prias prerrogativas de supremacia para n\u00e3o saldar seus d\u00e9bitos a tempo e modo. De acordo o autor Joel de Menezes Nieburh[12]<\/a>:<\/p>\n \u201cN\u00e3o \u00e9 raro que a Administra\u00e7\u00e3o, para n\u00e3o pagar o contratado, recuse-se a liquidar a despesa. Ou seja, o contratado executa o contrato, entrega \u00e0 Administra\u00e7\u00e3o P\u00fablica, por\u00e9m ela se recusa a fazer as medi\u00e7\u00f5es, a reconhecer o que foi executado. Sucede que ela precisa liquidar a despesa para o contratado emitir a nota de faturamento e, com isso, entrar na fila da ordem cronol\u00f3gica. A Administra\u00e7\u00e3o P\u00fablica se recusa a liquidar a despesa porque da\u00ed parece ao controle que n\u00e3o h\u00e1 problemas de inadimplemento. Isso deve ser coibido e o mesmo vale para o pagamento e para todos os pedidos formulados pelos contratados.\u201d<\/em><\/p>\n \u00a0<\/em>Isso significa dizer que os particulares deixam de receber pelos servi\u00e7os prestados, o que enseja outra hip\u00f3tese de tratativa com o Estado para a cobran\u00e7a dos d\u00e9bitos em aberto e, portanto, outro espa\u00e7o em potencial para a ocorr\u00eancia de atos il\u00edcitos.<\/p>\n Fiscaliza\u00e7\u00e3o.<\/strong> Some-se a isso o fato de que h\u00e1 um ineg\u00e1vel d\u00e9ficit de fiscaliza\u00e7\u00e3o externa da execu\u00e7\u00e3o dos contratos administrativos, notadamente pelos Tribunais de Contas[13]<\/a>. N\u00e3o existe no Brasil, salvo raras exce\u00e7\u00f5es, uma fiscaliza\u00e7\u00e3o eficiente e concomitante \u00e0 execu\u00e7\u00e3o contratual, mas apenas uma auditoria posterior, incapaz de identificar desvios e corrigi-los a tempo e modo. Ou seja, os mandamentos dos arts. 70 e 71 da Constitui\u00e7\u00e3o Federal est\u00e3o longe de serem cumpridos[14]<\/a>, o que agrava e potencializada os desvios \u00e9ticos durante a execu\u00e7\u00e3o dos contratos. Aqui, cumpre citar o autor Fabr\u00edcio Motta[15]<\/a>:<\/p>\n \u201cOs \u00f3rg\u00e3os de controle da Administra\u00e7\u00e3o costumam dedicar muita aten\u00e7\u00e3o para a an\u00e1lise da licita\u00e7\u00e3o, buscando identificar ilegalidades no edital ou no procedimento que comprometam a lisura do certame. Entretanto, acredito que atualmente os principais v\u00edcios corruptivos ocorrem na execu\u00e7\u00e3o dos contratos, e n\u00e3o na realiza\u00e7\u00e3o da licita\u00e7\u00e3o. Isso deve ser creditado a fatores como o incremento da atua\u00e7\u00e3o de \u00f3rg\u00e3os de controle interno e externo, o amplo acesso a informa\u00e7\u00f5es e o crescimento do controle social, exercitado pela popula\u00e7\u00e3o. Desta forma, se em tempos passados bastava prever pre\u00e7os superiores aos vigentes no mercado (sobrepre\u00e7o) para desviar os valores excedentes, atualmente \u00e9 mais f\u00e1cil conseguir esse excedente criminoso durante a execu\u00e7\u00e3o contratual.\u201d<\/em><\/p>\n E isso sem mencionar a contest\u00e1vel origem dos conselheiros e ministros dos Tribunais de Contas e os esc\u00e2ndalos que tamb\u00e9m acometem tais cortes (ver aqui<\/a> e aqui<\/a>).<\/p>\n Destarte, a execu\u00e7\u00e3o do contrato administrativo exige uma gest\u00e3o eficiente e de extremo cuidado, principalmente por parte das empresas, visto que, tamb\u00e9m nesta fase, existem v\u00e1rios espa\u00e7os aptos a ensejar a pr\u00e1tica de atos de corrup\u00e7\u00e3o ou improbidade, sem mencionar os criminais (inclusive, pode-se dizer, em maior potencial que a pr\u00f3pria fase licitat\u00f3ria).<\/p>\n Compliance. <\/strong>As Leis n\u00ba 12.846\/2013 (anticorrup\u00e7\u00e3o), n\u00ba 8.429\/93 (improbidade) e n\u00ba 8.666\/93 (licita\u00e7\u00e3o) preveem v\u00e1rias a\u00e7\u00f5es ou omiss\u00f5es consideradas como condutas lesivas e il\u00edcitas (atos de corrup\u00e7\u00e3o, improbidade e criminais).<\/p>\n A Lei Anticorrup\u00e7\u00e3o lista, em um rol taxativo, v\u00e1rias destas a\u00e7\u00f5es cuja pr\u00e1tica ocorre justamente na execu\u00e7\u00e3o dos contratos administrativos, confira-se:<\/p>\n \u201cArt. 5o\u00a0 Constituem atos lesivos \u00e0 administra\u00e7\u00e3o p\u00fablica, nacional ou estrangeira, para os fins desta Lei, todos aqueles praticados pelas pessoas jur\u00eddicas mencionadas no par\u00e1grafo \u00fanico do art. 1o, que atentem contra o patrim\u00f4nio p\u00fablico nacional ou estrangeiro, contra princ\u00edpios da administra\u00e7\u00e3o p\u00fablica ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, assim definidos:<\/em><\/p>\n IV – no tocante a licita\u00e7\u00f5es e contratos:<\/em><\/p>\n V – dificultar atividade de investiga\u00e7\u00e3o ou fiscaliza\u00e7\u00e3o de \u00f3rg\u00e3os, entidades ou agentes p\u00fablicos, ou intervir em sua atua\u00e7\u00e3o, inclusive no \u00e2mbito das ag\u00eancias reguladoras e dos \u00f3rg\u00e3os de fiscaliza\u00e7\u00e3o do sistema financeiro nacional.\u201d <\/em><\/p>\n \u00a0<\/em><\/p>\n Por sua vez, as san\u00e7\u00f5es para a pr\u00e1tica de tais atos encontram-se previstas nos arts. 6 e 19 da norma:<\/p>\n \u201cArt. 6o\u00a0 Na esfera administrativa, ser\u00e3o aplicadas \u00e0s pessoas jur\u00eddicas consideradas respons\u00e1veis pelos atos lesivos previstos nesta Lei as seguintes san\u00e7\u00f5es:<\/em><\/p>\n I – multa, no valor de 0,1% (um d\u00e9cimo por cento) a 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do \u00faltimo exerc\u00edcio anterior ao da instaura\u00e7\u00e3o do processo administrativo, exclu\u00eddos os tributos, a qual nunca ser\u00e1 inferior \u00e0 vantagem auferida, quando for poss\u00edvel sua estima\u00e7\u00e3o; e<\/em><\/p>\n II – publica\u00e7\u00e3o extraordin\u00e1ria da decis\u00e3o condenat\u00f3ria.<\/em><\/p>\n Art. 19.\u00a0 Em raz\u00e3o da pr\u00e1tica de atos previstos no art. 5o desta Lei, a Uni\u00e3o, os Estados, o Distrito Federal e os Munic\u00edpios, por meio das respectivas Advocacias P\u00fablicas ou \u00f3rg\u00e3os de representa\u00e7\u00e3o judicial, ou equivalentes, e o Minist\u00e9rio P\u00fablico, poder\u00e3o ajuizar a\u00e7\u00e3o com vistas \u00e0 aplica\u00e7\u00e3o das seguintes san\u00e7\u00f5es \u00e0s pessoas jur\u00eddicas infratoras: <\/em><\/p>\n I – perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infra\u00e7\u00e3o, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-f\u00e9;<\/em><\/p>\n II – suspens\u00e3o ou interdi\u00e7\u00e3o parcial de suas atividades; <\/em><\/p>\n III – dissolu\u00e7\u00e3o compuls\u00f3ria da pessoa jur\u00eddica;<\/em><\/p>\n IV – proibi\u00e7\u00e3o de receber incentivos, subs\u00eddios, subven\u00e7\u00f5es, doa\u00e7\u00f5es ou empr\u00e9stimos de \u00f3rg\u00e3os ou entidades p\u00fablicas e de institui\u00e7\u00f5es financeiras p\u00fablicas ou controladas pelo poder p\u00fablico, pelo prazo m\u00ednimo de 1 (um) e m\u00e1ximo de 5 (cinco) anos.\u201d<\/em><\/p>\n \n Igualmente, o faz a Lei n\u00ba 8.666\/93:<\/p>\n \n \u201cArt.\u00a092.\u00a0\u00a0Admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer modifica\u00e7\u00e3o ou vantagem, inclusive prorroga\u00e7\u00e3o contratual, em favor do adjudicat\u00e1rio, durante a execu\u00e7\u00e3o dos contratos celebrados com o Poder P\u00fablico, sem autoriza\u00e7\u00e3o em lei, no ato convocat\u00f3rio da licita\u00e7\u00e3o ou nos respectivos instrumentos contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preteri\u00e7\u00e3o da ordem cronol\u00f3gica de sua exigibilidade, observado o disposto no art. 121 desta Lei:<\/em><\/p>\n Pena\u00a0–\u00a0deten\u00e7\u00e3o, de dois\u00a0a quatro\u00a0anos, e multa.<\/em><\/p>\n Par\u00e1grafo\u00a0\u00fanico.\u00a0\u00a0Incide na mesma pena o contratado que, tendo comprovadamente concorrido para a consuma\u00e7\u00e3o da ilegalidade, obt\u00e9m vantagem indevida ou se beneficia, injustamente, das modifica\u00e7\u00f5es ou prorroga\u00e7\u00f5es contratuais.\u201d <\/em><\/p>\n \n E, ainda, a Lei de Improbidade, ao citar em seus artigos 9, 10 e 11 v\u00e1rias a\u00e7\u00f5es ou omiss\u00f5es que podem ser praticadas no bojo dos contratos p\u00fablicos, sendo que, nos termos do seu artigo 3\u00ba, o particular que \u201cinduza ou concorra para a pr\u00e1tica do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta<\/em>\u201d tamb\u00e9m ser\u00e1 pun\u00edvel no que couber.<\/p>\n As san\u00e7\u00f5es aplic\u00e1veis est\u00e3o previstas no artigo 12 da norma, quais sejam, (i) perda dos bens ou valores acrescidos indevidamente, (ii) ressarcimento integral do dano e (iii) pagamento de multa c\u00edvel de at\u00e9 tr\u00eas vezes o valor do dano e proibi\u00e7\u00e3o de contratar com o Poder P\u00fablico ou receber benef\u00edcios ou incentivos fiscais ou credit\u00edcios, direta ou indiretamente, ainda que por interm\u00e9dio de pessoa jur\u00eddica da qual seja s\u00f3cio majorit\u00e1rio, por at\u00e9 dez anos.<\/p>\n Diante de todo o exposto at\u00e9 aqui, verifica-se a imperiosa e urgente necessidade da implementa\u00e7\u00e3o de um robusto Programa de Integridade pelas empresas (e pelo pr\u00f3prio governo), visando a preven\u00e7\u00e3o, detec\u00e7\u00e3o e remedia\u00e7\u00e3o de atos lesivos \u00e0 Administra\u00e7\u00e3o P\u00fablica tamb\u00e9m no \u00e2mbito da execu\u00e7\u00e3o de contratos administrativos.<\/p>\n Segundo o artigo 41 do Decreto n\u00ba 8.420\/2017, que regulamenta a Lei n\u00ba 12.846\/2013, o Programa de Integridade consiste no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo \u00e0 den\u00fancia de irregularidades e na aplica\u00e7\u00e3o efetiva de c\u00f3digos de \u00e9tica e de conduta, pol\u00edticas e diretrizes com objetivo de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos il\u00edcitos praticados contra a administra\u00e7\u00e3o p\u00fablica, nacional ou estrangeira.<\/em><\/p>\n O regulamento em comento tamb\u00e9m indica (art. 42) quais s\u00e3o os par\u00e2metros que devem nortear a institui\u00e7\u00e3o e avalia\u00e7\u00e3o de um Programa de Integridade. Com base em tais assertivas, a Controladoria Geral da Uni\u00e3o[16]<\/a> subdividiu as caracter\u00edsticas de um eficiente Programa de Integridade em cinco pilares, s\u00e3o eles:<\/p>\n No que se refere \u00e0 execu\u00e7\u00e3o dos contratos administrativos – e sem retirar, de forma alguma, a imensur\u00e1vel import\u00e2ncia dos outros pilares[17]<\/a> – a escorreita estrutura\u00e7\u00e3o de regras e instrumentos merece especial relev\u00e2ncia, visto que \u00e9 imprescind\u00edvel que a empresa possua eficientes pol\u00edticas internas regrando o relacionamento dos seus colaboradores com o Poder P\u00fablico.<\/p>\n V\u00e1rias s\u00e3o as regras e ferramentas que podem prevenir riscos e desvios (corrup\u00e7\u00e3o, improbidade e crimes) na execu\u00e7\u00e3o de contratos p\u00fablicos e evitar – ou reduzir – a penaliza\u00e7\u00e3o da empresa, como, por exemplo, (a) a defini\u00e7\u00e3o de uma rotatividade de colaboradores em contato com a Administra\u00e7\u00e3o, (b) determina\u00e7\u00e3o de que reuni\u00f5es sejam atendidas por ao menos dois colaboradores, (c) valida\u00e7\u00e3o tanto pelo jur\u00eddico quanto pelo setor de compliance dos documentos sens\u00edveis referentes a altera\u00e7\u00f5es contratuais (mudan\u00e7as nos projetos, quantitativos, cronograma de execu\u00e7\u00e3o e financeiro, reequil\u00edbrios econ\u00f4mico financeiros, supress\u00f5es, dentre outros), (d) regras antissuborno e anticorrup\u00e7\u00e3o, (e) pol\u00edticas de brindes, presentes e hospitalidades prevendo expressamente regras no relacionamento com agentes p\u00fablicos, (f) previs\u00e3o de treinamentos cont\u00ednuos dos colaboradores e implementa\u00e7\u00e3o de canais de den\u00fancia, (g) efetiva\u00e7\u00e3o de auditorias rotineiras e investiga\u00e7\u00f5es internas (h) defini\u00e7\u00e3o de medidas disciplinares, etc.<\/p>\n Tais ferramentas tamb\u00e9m devem ser adaptadas e utilizadas pelo governo juntamente com o aumento da transpar\u00eancia dos atos relativos \u00e0 execu\u00e7\u00e3o dos contratos, criando-se um Programa de Compliance tamb\u00e9m no lado p\u00fablico.<\/p>\n Al\u00e9m de prevenir e mitigar os riscos de eventuais infra\u00e7\u00f5es, um Programa de Compliance deve ser levado em considera\u00e7\u00e3o na aplica\u00e7\u00e3o das san\u00e7\u00f5es previstas na Lei Anticorrup\u00e7\u00e3o – sendo crit\u00e9rio objetivo para a diminui\u00e7\u00e3o da pena -, bem como propicia v\u00e1rios outros benef\u00edcios para a empresa, como a preserva\u00e7\u00e3o da marca, imagem e credibilidade junto a clientes, acionistas e investidores cumulada\u00a0 com o aumento da efici\u00eancia, produtividade e lucratividade.<\/p>\n Inclusive, certamente visando tais benef\u00edcios, o Estado do Rio de Janeiro editou a rec\u00e9m-publicada Lei n\u00ba 7.753\/2017, a fim de exigir que os seus contratados implementem um Programa de Integridade em at\u00e9 180 (cento e oitenta) dias ap\u00f3s a assinatura da respectiva aven\u00e7a[18]<\/a>.<\/p>\n Segundo o artigo 2\u00ba da referida norma, tal exig\u00eancia objetiva (a) proteger a administra\u00e7\u00e3o p\u00fablica estadual dos atos lesivos que resultem em preju\u00edzos financeiros causados por irregularidades, desvios de \u00e9tica e de conduta e fraudes contratuais; (b) garantir a execu\u00e7\u00e3o dos contratos em conformidade com a Lei e regulamentos pertinentes a cada atividade contratada; (c) reduzir os riscos inerentes aos contratos, provendo maior seguran\u00e7a e transpar\u00eancia na sua consecu\u00e7\u00e3o; e (d) obter melhores desempenhos e garantir a qualidade nas rela\u00e7\u00f5es contratuais.<\/p>\n Al\u00e9m disso, a Lei, refor\u00e7ando o j\u00e1 exposto linhas acima, traz as bases e premissas para a efetiva constru\u00e7\u00e3o ou aprimoramento de um Programa de Integridade, a partir dos elementos elencados nos seus artigos 3\u00ba e 4\u00ba.<\/p>\n Por certo, a tend\u00eancia \u00e9 que a exig\u00eancia em comento se repita em um futuro pr\u00f3ximo em \u00e2mbito federal, no Distrito Federal e em outros estados e munic\u00edpios, haja vista a incontest\u00e1vel import\u00e2ncia dos Programas de Integridade na execu\u00e7\u00e3o de contratos p\u00fablicos.<\/p>\n Conclus\u00e3o. <\/strong>Destarte, \u00e9 fundamental que os particulares que contratam com o Poder P\u00fablico foquem seus Programas de Integridade tamb\u00e9m na execu\u00e7\u00e3o dos contratos, ou seja, na fase p\u00f3s-licita\u00e7\u00e3o, gerindo a tempo e modo a conformidade das a\u00e7\u00f5es dos seus colaboradores e da pr\u00f3pria pessoa jur\u00eddica, bem como instituindo regras e pol\u00edticas internas especiais sobre a mat\u00e9ria, de acordo com as caracter\u00edsticas e especificidades de cada empresa, sob pena de tais programas n\u00e3o serem efetivos na pr\u00e1tica (e n\u00e3o atenderem aos requisitos e crit\u00e9rios previstos nas recentes normas sobre o tema).<\/p>\n \n Thiago Magalh\u00e3es Freitas S\u00e1<\/strong>, advogado do Chenut Oliveira Santiago Sociedade de Advogados e integrante das equipes de Direito P\u00fablico, Compliance e Regulat\u00f3rio.<\/p>\n [1]<\/a> Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constitui\u00e7\u00e3o Federal, institui normas para licita\u00e7\u00f5es e contratos da Administra\u00e7\u00e3o P\u00fablica e d\u00e1 outras provid\u00eancias.<\/p>\n \n [2]<\/a> Artigos 58 e 65 da Lei n\u00ba 8.666\/93.<\/p>\n [3]<\/a> Artigo 78, XV, da Lei n\u00ba 8.666\/93.<\/p>\n [4]<\/a> Artigo 87 da Lei n\u00ba 8.666\/93.<\/p>\n [5]<\/a> Artigos 58, 78 e 79 da Lei n\u00ba 8.666\/93.<\/p>\n [6]<\/a> \u00a0Art. 37. A administra\u00e7\u00e3o p\u00fablica direta e indireta de qualquer dos Poderes da Uni\u00e3o, dos Estados, do Distrito Federal e dos Munic\u00edpios obedecer\u00e1 aos princ\u00edpios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e efici\u00eancia<\/strong> e, tamb\u00e9m, ao seguinte (…).<\/p>\n [7]<\/a> Justen Filho, Mar\u00e7al. Corrup\u00e7\u00e3o e contrata\u00e7\u00e3o administrativa: a necessidade de reformula\u00e7\u00e3o do modelo jur\u00eddico brasileiro. Publicado em gazetadopovo.com.br, acesso em 25\/09\/2017.<\/p>\n [8]<\/a> Segundo a autora Helena Regina Lobo da Costa, as caracter\u00edsticas institucionais, pol\u00edticas e sociais do per\u00edodo colonial relevam muito sobre as origens e raz\u00f5es das pr\u00e1ticas de corrup\u00e7\u00e3o no Brasil. Indubitavelmente, a an\u00e1lise tamb\u00e9m dos per\u00edodos imperial e republicano \u00e9 necess\u00e1ria para que se possa adquirir uma compreens\u00e3o mais aprofundada e abrangente da mat\u00e9ria (…). N\u00e3o se ignora que o contexto institucional atual, em termos pol\u00edticos, administrativos e organizacionais seja radicalmente diverso do descrito acima. Contudo, a falta de respeito a falta de respeito com a coisa p\u00fablica, a sobreposi\u00e7\u00e3o de interesses privados e\u00a0 a concep\u00e7\u00e3o de utiliza\u00e7\u00e3o de cargo p\u00fablico para benef\u00edcio pr\u00f3prio – que claramente j\u00e1 se delinearam desde o per\u00edodo colonial \u2013 apresentam-se absolutamente iguais na atualidade. Helena Regina Lobo da Costa, Corrup\u00e7\u00e3o na hist\u00f3ria do Brasil: Reflex\u00f5es sobre suas origens no per\u00edodo colonial. Temas de Anticorrup\u00e7ao e Compliance, Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.<\/p>\n [9]<\/a> Art. 167. S\u00e3o vedados:<\/p>\n I – o in\u00edcio de programas ou projetos n\u00e3o inclu\u00eddos na lei or\u00e7ament\u00e1ria anual;<\/p>\n II – a realiza\u00e7\u00e3o de despesas ou a assun\u00e7\u00e3o de obriga\u00e7\u00f5es diretas que excedam os cr\u00e9ditos or\u00e7ament\u00e1rios ou adicionais;<\/p>\n [10]<\/a> Art.\u00a05o\u00a0\u00a0Todos os valores, pre\u00e7os e custos utilizados nas licita\u00e7\u00f5es ter\u00e3o como express\u00e3o monet\u00e1ria a moeda corrente nacional, ressalvado o disposto no art. 42 desta Lei, devendo cada unidade da Administra\u00e7\u00e3o, no pagamento das obriga\u00e7\u00f5es relativas ao fornecimento de bens, loca\u00e7\u00f5es, realiza\u00e7\u00e3o de obras e presta\u00e7\u00e3o de servi\u00e7os, obedecer, para cada fonte diferenciada de recursos, a estrita ordem cronol\u00f3gica das datas de suas exigibilidades, salvo quando presentes relevantes raz\u00f5es de interesse p\u00fablico e mediante pr\u00e9via justificativa da autoridade competente, devidamente publicada.<\/p>\n [11]<\/a> Um dos mais comuns argumentos utilizados \u00e9 que os d\u00e9bitos dos exerc\u00edcios anteriores n\u00e3o devem respeitar a ordem cronol\u00f3gica, o que \u00e9 sustentado a partir de uma distor\u00e7\u00e3o das disposi\u00e7\u00f5es do art. 37 da Lei n\u00ba 4.320\/64.<\/p>\n [12]<\/a> NIEBUHR, Joel de Menezes. Dez medidas de combate \u00e0 inseguran\u00e7a jur\u00eddica e ao inadimplemento da Administra\u00e7\u00e3o P\u00fablica em contratos administrativos.<\/em> Revista Z\u00eanite \u2013 Informativo de Licita\u00e7\u00f5es e Contratos , Curitiba: Z\u00eanite, nov. 2016.<\/p>\n [13]<\/a> A este respeito, ver o artigo \u201cCrise fiscal: o que deu errado com a fiscaliza\u00e7\u00e3o dos tribunais de Contas?\u201d. Publicado pelo autor Fabr\u00edcio Motta em 11\/05\/2017 no site consultor jur\u00eddico.<\/p>\n [14]<\/u><\/a> Art. 70. A fiscaliza\u00e7\u00e3o cont\u00e1bil, financeira, or\u00e7ament\u00e1ria, operacional e patrimonial da Uni\u00e3o e das entidades da administra\u00e7\u00e3o direta e indireta, quanto \u00e0 legalidade, legitimidade, economicidade, aplica\u00e7\u00e3o das subven\u00e7\u00f5es e ren\u00fancia de receitas, ser\u00e1 exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.<\/p>\n Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, ser\u00e1 exercido com o aux\u00edlio do Tribunal de Contas da Uni\u00e3o, ao qual compete:<\/p>\n [15]<\/u><\/a> Artigo Licitar n\u00e3o basta, \u00e9 preciso fiscalizar a execu\u00e7\u00e3o dos contratos, publicado no site consultor jur\u00eddico em 28\/04\/2016, acesso em 01\/10\/2017.<\/p>\n [16]<\/a> Programa de Integridade \u2013 Diretrizes para Empresas Privadas, setembro\/2015. Controladoria Geral da Uni\u00e3o.<\/p>\n [17]<\/a> De acordo com a CGU (obra citada acima): O Programa de Integridade deve ser entendido como uma estrutura org\u00e2nica, que somente funcionar\u00e1 caso exista harmonia e conex\u00e3o entre seus pilares. O monitoramento cont\u00ednuo, por exemplo, pode indicar a necessidade de revis\u00e3o de algumas regras e instrumentos; o mesmo ocorrendo no caso de mudan\u00e7a no cen\u00e1rio de riscos da empresa. O comprometimento da alta administra\u00e7\u00e3o e a autonomia da inst\u00e2ncia respons\u00e1vel pelo Programa, por outro lado, s\u00e3o fatores determinantes para a implementa\u00e7\u00e3o das regras e instrumentos estabelecidos, em especial daqueles relacionados \u00e0 aplica\u00e7\u00e3o de penalidades e remedia\u00e7\u00e3o de irregularidades.<\/p>\n\n
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