Artigos - Postado em: 02/05/2023

Taxatividade do rol da ANS para tratamento de pessoas com transtorno do espectro autista

Conforme disposto na Lei 12.764 de 27/12/2012, é considerada pessoa com transtorno do espectro autista (TEA) aquela portadora de síndrome clínica, caracterizada pela deficiência persistente e clinicamente significativa da comunicação e da interação social, manifestada por deficiência marcada de comunicação verbal e não verbal usada para interação social; ausência de reciprocidade social; falência em desenvolver e manter relações apropriadas ao seu nível de desenvolvimento.

Noutro norte, também é considerada pessoa com transtorno do espectro autista aquela portadora de síndrome clínica caracterizada por padrões restritivos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades, manifestados por comportamentos motores ou verbais estereotipados ou por comportamentos sensoriais incomuns; excessiva aderência a rotinas e padrões de comportamento ritualizados; interesses restritos e fixos.

Ainda, conforme disposto na Lei 12.764 de 27/12/2012, as pessoas com TEA são consideradas pessoa com deficiência para todos os efeitos legais.

Há uma estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de que 10% da população brasileira possua o transtorno do espectro autista, considerando que o censo realizou o levantamento de dados sobre autismo pela primeira vez[1].

Existem diversos tratamentos para pessoas com autismo que objetivam melhorar a comunicação, a concentração e diminuir os movimentos repetitivos, dando mais qualidade de vida a quem recebe o diagnóstico, bem como à sua família. Em uma análise marco, um tratamento eficaz envolve equipes médicas, fisioterapeutas, fonoaudiólogo, cuidados com alimentações e atividades como musicoterapia e equoterapia, dentre outras.

O tratamento de musicoterapia, por exemplo, estimula a comunicação e auxilia o processo de desenvolvimento da vocalização e fala e também de estímulos sensoriais para abranger o processamento auditivo, reconhecimento e discriminação de sons.

Esses tratamentos podem ser fornecidos pelo plano de saúde e em setembro de 2022, foi aprovado o projeto de lei que estabeleceu que o rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é exemplificativo. O projeto n° 2.033/22 dispõe sobre os planos privados de assistência à saúde para estabelecer hipóteses de cobertura de exames ou tratamentos de saúde que não estão incluídos no rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar.

Todavia, o Superior Tribunal de Justiça aprovou o rol taxativo da ANS, limitando os procedimentos disponibilizados pelos planos de saúde, já que para serem oferecidos deveriam estar descritos na lista regulamentada, cortando muitos tratamentos, inclusive, os realizados por pessoas portadoras de TEA, a exemplo da musicoterapia antes citada.

Contudo, a Ministra Nancy Andrighi (REsp 2.043.003-SP) permitiu, em caráter excepcional, a cobertura obrigatória do tratamento multidisciplinar de musicoterapia para o beneficiário portador de transtorno do espectro autista, evidenciando que “é devido o reembolso integral de tratamento multidisciplinar para beneficiário portador de transtorno do espectro autista realizado fora da rede credenciada, inclusive às sessões de musicoterapia, na hipótese de inobservância de prestação assumida no contrato ou se ficar demonstrado o descumprimento de ordem judicial”.

Confira resumo do referido julgado abaixo:

“DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR – Plano de saúde. Natureza taxativa, em regra, do rol da ANS. Tratamento multidisciplinar prescrito para beneficiário portador de transtorno do espectro autista. Musicoterapia. Cobertura obrigatória. Reembolso integral. Excepcionalidade. RESUMO: Até 1/7/2022, data da vigência da Resolução Normativa n. 539/2022 da ANS, é devido o reembolso integral de tratamento multidisciplinar para beneficiário portador de transtorno do espectro autista realizado fora da rede credenciada, inclusive às sessões de musicoterapia, na hipótese de inobservância de prestação assumida no contrato ou se ficar demonstrado o descumprimento de ordem judicial. (REsp 2.043.003-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 21/3/2023, DJe 23/3/2023.)”

Nesse cenário, diante da decisão favorável ao tratamento que viabiliza que as pessoas com TEA tenham direito à musicoterapia, inaugura-se nova linha interpretativa quanto a taxatividade do rol da ANS pelo STJ, sendo de extrema importância que as pessoas que tenham qualquer negativa quanto ao fornecimento de serviços de saúde essenciais ao tratamento do TEA (assim como para vários outros diagnósticos que necessitem de medicações e/ou terapias coadjuvantes/multidisciplinares) procurem auxílio de uma especialista jurídico para que possam requerer judicialmente, em caráter de urgência, a concessão do tratamento, bem como obtenham o reembolso de valores eventualmente já despendidos.

[1]https://folhabv.com.br/noticia/CIDADES/Capital/Censo-do-IBGE-levanta-dados-sobre-autismo-pela-1a-vez/89074

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