Artigos - Postado em: 20/03/2023

Sua empresa está preparada para as mudanças da CIPA?

Por Mariana Machado Pedroso

Em 22/09/2022 foi publicada no Diário Oficial a União a Lei Federal de nº 14.457/2022 que ficou mais conhecida por instituir o programa “emprega+ mulheres”, ganha novo capítulo (e obrigação) a partir do mês que vem.

Em que pese o chamariz da Lei destacando mulheres, as matérias lá abordadas promoveram profundas mudanças em outros temas, tais como o apoio à parentalidade na primeira infância e a imposição de adoção de medidas de prevenção e de combate ao assédio sexual e a outras formas de violência no âmbito do trabalho, tema do presente artigo.

Por óbvio, a inclusão deste tema sensível e urgente em uma Lei voltada para criar mecanismos que reduzissem o desequilíbrio das responsabilidades entre pais e mães e privilegiassem formas de aumentar a empregabilidade da mulher, não foi à toa.

É sabido e consabido que são as mulheres as maiores vítimas de assédio sexual, sendo, portanto, esperado que esse reflexo da sociedade também se faça presente no ambiente de trabalho.

De acordo com um levantamento realizado pela empresa Mindsight, especialista na gestão de recursos humanos, após ouvir mais de 11 mil pessoas em todo Brasil, para cada homem abusado sexualmente temos 3 mulheres na mesma situação.

Esse espantoso – porém, infelizmente, já esperado – elevado número de vítimas mulheres de abuso sexual pode encontrar explicação pelo perfil dos assediadores já que 76% das pessoas foram assediadas sexualmente por homens enquanto 24% por amulheres.

Já quando o recorte é outro – assédio moral – essa proporcionalidade se reduz substancialmente, tendo 38% das mulheres assentido terem sido vítimas de assédio moral, enquanto nos homens esse percentual somou 30%.

E o perfil dos autores é composto por 62% de homens contra 38% de mulheres.

Outro dado importante apurado pela Justiça do Trabalho indica que em 2021 foram registrados mais de 52 mil casos de assédio moral no Brasil e mais de 3 mil casos de assédio sexual. Esses números, apesar de elevados, estão ao largo de demonstrar a realidade do ambiente de trabalho, vez que apenas 6,6% das mulheres e 6,4% dos homens que foram vítimas de assédio moral registram algum tipo de denúncia (Mindsight)

Olhando para estes números, fica evidente a urgência de inserir no ambiente de trabalho medidas formais para combater estas práticas.

Pois bem! Criada essa obrigação pela Lei “Emprega + mulheres” de setembro de 2022, cabia então ao Ministério do Trabalho e Previdência regulamentar esse tema para fazer valer o cumprimento da norma. Era, portanto, necessário pragmatizar a obrigação para viabilizar a fiscalização de seu cumprimento!

Desta necessidade surgiu a Portaria 4.219 em 20 de dezembro de 2022, alterado nada mais, nada menos, do que 17 normas regulamentadoras, claro, com o objetivo de adequá-las à obrigação e combate ao assédio sexual e às outras formas de violência no trabalho.

As mudanças mais significativas são afetas à alteração da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e Assédio (CIPA) que teve sua nomenclatura mudada para a inclusão da palavra ‘assédio’ ao final. Tornou-se, portanto, atribuição da CIPA adotar medidas efetivas de combate à violência no ambiente de trabalho com especial enfoque ao assédio sexual.

A partir do próximo mês fica imperativa a adoção, por parte da CIPA, de medidas efetivas de prevenção e combate ao assédio sexual e moral, não bastando, apenas a fixação de cartazes como até então algumas empregadoras adotava.

Dentre outras obrigações, deverão ser expressamente incluídas regras de condutas específicas sobre o tema nos regulamentos internos da empresa, com a capacitação de todos, aqui incluindo os c-levels, além de fixar procedimentos sobre eventuais denúncias e suas consequências. Passa, ainda, o assédio sexual e demais formas de violência no ambiente de trabalho a ser assunto recorrente nas reuniões e práticas capitaneadas pela CIPA.

Vale lembrar que a Norma Regulamentadora 5, que instituiu a CIPA, traz os seus objetivos, sua constituição, sua organização, suas atribuições, seu funcionamento, seu dimensionamento  e demais informações indispensáveis para o conhecimento e adequação da Comissão. É, portanto, leitura obrigatória, já antecipando que em grande parte das atividades, as empresas que contarem com 20 ou mais empregados estarão obrigadas a constituir CIPA.

É importante destacar que muito embora a vigência da Lei que promoveu tais alterações tenha se iniciado com sua publicação em setembro do ano passado, a obrigatoriedade da implantação de tais medidas passa a valer a partir do mês que vem, dia 20. O que significa que a partir de então, a fiscalização realizada pelo Ministério do Trabalho e Previdência através das Delegacias Regionais do Trabalho, bem como pelo Ministério Público do Trabalho terá sinal verde para cobrar sua execução.

Não estando adequada à novas obrigações, poderá a empresa vir a ser autuada, além de pagar uma multa sem que tais aros à eximam de cumprir a própria obrigação. Vale destacar que a Portaria, ao final, estabelece, de forma expressa, que o conteúdo sobre prevenção e combate ao assédio sexual e outras formas de violência no trabalho deverá se incluído nos treinamentos a serem realizados a partir desta data e, os que já tenham ocorrido, deverão ser complementados com este conteúdo.

Atenção especial para todas as empresas que já tenham CIPA constituída há mais tempo, mas que também terão o mesmo prazo para adequá-las às novas responsabilidades.

Também merece toda a atenção àquelas empresas que eventualmente tenham sofrido condenação judicial ou, ainda, tenham firmado acordos, judicias ou extrajudiciais (especial destaque ao acordo firmado com o Ministério Público do Trabalho) abordando estas matérias. As novas obrigações podem acarretar a necessidade de revisão destes termos, seja judicial ou extrajudicialmente a depender da fase em que se encontrarem.

Por fim, mas não menos importante, um último destaque merece ser dado para as empresas que pertencem aos setores da economia já conhecidos pelo domínio feminino.

De acordo com o portal Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), as mulheres, maiores vítimas do assédio sexual, representam apenas 32% da força de trabalho nas indústrias brasileiras, sendo os setores que mais empregam mulheres o de confecções e vestuários (75%) e a indústria farmacêutica (57%).

Assim, fazendo uma aposta, há grandes chances de que a fiscalização se inicie pelas empresas que integram estes setores, haja vista a compreensão de que, em tese, estariam expostos à um risco maior das práticas de assédio sexual e moral.

Bom, o tempo está acabando e, assim, fica a pergunta: a sua empresa já está pronta para estas novas obrigações?

*Mariana Machado Pedroso, especialista em Direito do Trabalho, é sócia de Chenut Oliveira Santiago Advogados

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