Artigos - Postado em: 29/04/2025

Produtos Químicos Controlados: A Importância Estratégica da Gestão Eficiente e os Riscos às Empresas

Por Felipe Alves Pacheco em coautoria com Pedro Ivo

No Brasil, o controle de produtos químicos, utilizados no processo fabril das indústrias dos mais diversos setores, é rigorosamente regulamentado por órgãos federais, como a Polícia Federal e o Exército Brasileiro, e também pelas Polícias Civis estaduais. Tais produtos, conhecidos tecnicamente como Produtos Químicos Controlados, exigem das empresas não apenas responsabilidade técnica, mas também um rigoroso gerenciamento administrativo e jurídico.

O manejo inadequado desses produtos pode resultar em graves consequências jurídicas e administrativas, inclusive a responsabilização penal. Neste contexto, é indispensável que as empresas estejam atentas aos riscos inerentes à gestão de insumos químicos, especialmente diante do crescente desafio representado pelo desvio de substâncias químicas para atividades criminosas, como o narcotráfico, fabricação de armas e explosivos e a falsificação de produtos, a exemplo de medicamentos.

Produtos químicos controlados: o que são e por que são controlados?

Produtos químicos controlados são substâncias que, devido à sua composição e potencial de utilização indevida, estão sujeitos a rígidas normas e fiscalização estatal. Entre estes produtos, destacam-se substâncias com potencial explosivo, inflamável, tóxico ou aquelas que possam ser utilizadas para produção ou adulteração de entorpecentes.

A indústria química e a indústria farmacêutica, por exemplo, por lidarem cotidianamente com grande quantidade desses insumos, precisam ter procedimentos internos robustos de controle, armazenamento e registro para prevenir desvios e irregularidades.

Legislação aplicável e obrigações das empresas

O controle rigoroso desses produtos decorre principalmente da Lei nº 10.357/2001 e do Decreto nº 4.262/2002, regulamentados pela Portaria MJSP nº 204/2022. Tais normas determinam que as empresas devem:

  • Manter cadastro atualizado perante os órgãos reguladores.
  • Registrar periodicamente no Sistema de Controle de Produtos Químicos (SIPROQUIM), administrado pela Polícia Federal, todas as movimentações comerciais e operacionais envolvendo substâncias químicas controladas.
  • Submeter-se a fiscalizações regulares.
  • Garantir rastreabilidade dos produtos químicos adquiridos ou comercializados.

Além da Polícia Federal, outros órgãos também exercem competência sobre o controle de produtos químicos em território nacional. O Exército Brasileiro, por meio do Regulamento estabelecido pelo Decreto nº. 10.030/2019, realiza o controle e fiscalização de produtos químicos com potencial de uso bélico, explosivo ou que possam representar riscos à segurança pública, como nitrato de amônio, pólvora, dinamite, percloratos e ácidos de alta concentração.

As Polícias Civis estaduais também atuam na fiscalização de produtos químicos controlados, especialmente no âmbito de seus respectivos estados. Cada Polícia Civil segue a legislação estadual própria, podendo haver diferenças relevantes nos procedimentos de licenciamento, fiscalização e autuação entre os estados brasileiros. Assim, empresas que atuam em diversas unidades da federação devem estar atentas às regulamentações locais para assegurar o pleno cumprimento das normas estaduais de controle químico.

Qualquer falha no cumprimento dessas obrigações pode gerar multas administrativas, suspensão das atividades, cancelamento de licenças e, em casos mais graves, implicações penais para dirigentes e responsáveis legais.

É importante destacar que o registro junto aos órgãos de controle é exigido de forma específica para cada estabelecimento, para cada produto químico controlado e para cada atividade exercida. Assim, a autorização obtida por uma filial de determinada empresa é limitada aos produtos e atividades expressamente constantes em seu Certificado de Licença de Funcionamento (CLF) ou equivalente.

Por essa razão, uma filial somente pode armazenar, vender, comercializar ou transportar determinado produto químico controlado se possuir registro específico para aquele produto e para aquela atividade. A ausência de registro válido para o produto ou para a atividade desenvolvida configura infração administrativa e pode ensejar sanções severas, independentemente da boa-fé da empresa.

Além disso, as transações comerciais envolvendo produtos químicos controlados devem observar regras rígidas quanto à habilitação das partes envolvidas. A empresa fornecedora deve ser licenciada, a transportadora encarregada do transporte deve possuir autorização específica para o produto transportado e o destinatário final também deve estar devidamente registrado e autorizado junto à Polícia Federal.

Portanto, não basta que a empresa esteja licenciada — ela precisa assegurar que todos os agentes da cadeia de fornecimento também estejam. A realização de transações com fornecedores, transportadores ou clientes não habilitados também constitui infração administrativa grave, como demonstram os casos recentes analisados.

Esse conjunto de exigências visa garantir a rastreabilidade completa dos produtos químicos controlados e prevenir seu desvio para usos ilícitos, como o narcotráfico, fabricação clandestina de explosivos ou adulteração de medicamentos.

O papel estratégico da Polícia Federal e a importância das informações ao SIPROQUIM

A Polícia Federal desempenha papel crucial no combate ao tráfico de drogas e ao uso ilícito de insumos químicos. Por meio do SIPROQUIM, um banco de dados estratégico, as informações fornecidas pelas empresas são cruzadas para detectar possíveis desvios e práticas ilícitas.

Recentemente, investigações apontaram que até mesmo multinacionais de grande porte podem ser alvo de criminosos que atuam de maneira fraudulenta, utilizando nomes e dados fiscais dessas organizações para realizar transações ilegais sem que tenham conhecimento. Esses casos ilustram que não apenas pequenas empresas são vulneráveis; organizações de grande porte também podem sofrer com fraudes externas ou internas, levando a consequências jurídicas sérias.

Além disso, são frequentes as autuações administrativas em virtude de falhas de controle documental interno. Em um caso concreto, uma empresa foi autuada pela Polícia Federal por não apresentar uma nota fiscal relativa a uma operação de venda de ácido clorídrico, apontada durante fiscalização presencial. Posteriormente, apurou-se que a nota havia sido corretamente emitida e registrada por outra filial da mesma empresa, mas havia um equívoco cadastral nos mapas de controle enviados por terceiros no sistema da PF, o que demonstrou a necessidade de cuidado redobrado na gestão integrada das filiais e na conferência dos dados prestados por parceiros comerciais.

Em outra fiscalização, uma empresa foi autuada por omitir informações e reportar dados inconsistentes em seus mapas de controle submetidos à Polícia Federal, como divergências de peso em produtos químicos sensíveis e erro na indicação de atividade exercida (armazenagem versus comercialização). Houve também autuação por contratação de transporte realizada por uma filial de transportadora que, apesar de pertencer a um grupo autorizado, não possuía o licenciamento específico exigido pela Polícia Federal.

Casos como esses evidenciam que, ainda que não haja dolo ou má-fé, erros formais e falhas procedimentais podem comprometer a regularidade administrativa e ensejar sanções severas. Portanto, uma gestão eficaz dos Produtos Químicos Controlados (PQC) deve ser complementada por auditorias internas e externas e controles adicionais que possam identificar e prevenir fraudes, equívocos e inconsistências documentais.

Como prevenir irregularidades e garantir segurança jurídica?

Diante dos riscos associados à gestão inadequada ou falhas administrativas relacionadas aos produtos químicos controlados, as empresas podem adotar medidas preventivas, tais como:

  • Estruturação de um departamento especializado de compliance químico-farmacêutico.
  • Treinamento constante das equipes responsáveis pela aquisição, uso, armazenamento e descarte dos produtos químicos.
  • Implantação de auditorias internas regulares.
  • Adoção periódica de auditorias externas.
  • Monitoramento detalhado dos fornecedores e parceiros comerciais, assegurando a confiabilidade das transações realizadas.
  • Manutenção de documentação clara, precisa e atualizada, facilitando respostas rápidas e eficazes durante fiscalizações.

O papel dos assessores jurídicos também é fundamental. A assessoria jurídica especializada garante que a empresa esteja sempre em conformidade com as exigências legais, evitando penalidades administrativas e possíveis responsabilizações penais, além de mitigar os impactos financeiros e reputacionais derivados de irregularidades.

Conclusão: gestão eficiente é fundamental para segurança jurídica

Em resumo, diante do cenário atual, em que o desvio de produtos químicos controlados representa uma ameaça crescente e estratégica, especialmente para o setores químico e farmacêutico, uma gestão rigorosa desses produtos tornou-se imprescindível. O investimento em boas práticas internas, compliance eficaz e assessoramento jurídico especializado é a maneira mais segura para empresas farmacêuticas protegerem seu patrimônio, sua reputação e garantirem a continuidade das suas operações com segurança jurídica e administrativa.

Voltar