Artigos - Postado em: 11/05/2023

Entenda o overruling do Tema 677 do STJ

Com a tal mudança, é vantajoso economicamente ao devedor efetuar o depósito em dinheiro na fase de Execução? Quais os possíveis reflexos da questão em temas tributários?

Em 2014, o STJ  tinha o entendimento de que o depósito judicial efetuado na fase de Execução afastava a responsabilidade do devedor pelos juros e pela correção monetária, os quais passavam a ser de responsabilidade da Instituição Financeira depositária.

Esse entendimento culminou na edição no Tema 667 do STJ (REsp 1.348.640/RS:

Na fase de execução, o depósito judicial do montante (integral ou parcial) da condenação extingue a obrigação do devedor, nos limites da quantia depositada.” (Grifos nossos)

Assim, à época, não havia que se falar em encargos de mora em desfavor do devedor após o depósito judicial, já que o débito era atualizado pela Instituição Bancária que guardava o referido depósito.

Em outras palavras, no caso de o devedor ter depositado integralmente o valor objeto da lide, obtinha em seu favor uma espécie de “efeito liberatório” do débito, mesmo que o processo se arrastasse no Judiciário por vários anos.

A problemática é que os índices de atualização adotados pelos Bancos depositários podem ser diferentes e inferiores se comparados com aqueles devidos contratualmente, ou legalmente, em favor do credor.

Para ilustrar melhor o caso, imagine-se uma dívida (cível) de 1 milhão de reais contraída em janeiro de 2018, com incidência de correção monetária contratual calculada pela TR e os juros de mora de 1% ao mês. Em janeiro de 2023, a dívida representaria R$ 1.626.896,11.

Caso o devedor depositasse judicialmente a mesma quantia em janeiro de 2018, e na hipótese de o Banco aplicar a correção monetária pela TR somado com juros de Poupança (0,5% ao mês), o saldo final em conta judicial seria de R$ 1.237.686,89, o que implicaria em prejuízo ao credor em R$ 389.209,22.

Nesse cenário, a 3ª Turma do STJ, quando do julgamento do REsp n. 1.475.859/RJ, passou a relativizar a referida tese, fixando a orientação de que “o depósito judicial apenas extingue a obrigação do devedor nos limites da quantia depositada, mas não o libera dos consectários próprios de sua obrigação.” (Grifos nossos).

Ou seja, o entendimento desse precedente é no sentido de que obrigação da Instituição Financeira depositária pelo pagamento dos juros e da correção monetária sobre o valor depositado não mais desobriga o devedor de pagar os encargos de mora para o credor, caso a remuneração do Banco não seja suficiente para suprir essa diferença.

A partir de então, a jurisprudência do STJ passou a oscilar acerca da aplicação, ou não, do Tema 677 do STJ, na hipótese em que o depósito judicial não fosse efetuado com objetivo de pagamento voluntário ao credor. Por exemplo, quando o devedor garante o Juízo apenas para suspender a exigibilidade do crédito e, posteriormente, discute a dívida judicialmente.

Nesse cenário, como o Tema 677 do STJ não estava mais cumprindo a sua finalidade de uniformização jurisprudencial de forma adequada, o STJ evoluiu na sua revisão (REsp 1.820.963/SP), conferindo-lhe nova redação:

“Na execução, o depósito efetuado a título de garantia do juízo ou decorrente da penhora de ativos financeiros não isenta o devedor do pagamento dos consectários de sua mora, conforme previstos no título executivo, devendo-se, quando da efetiva entrega do dinheiro ao credor, deduzir do montante final devido o saldo da conta judicial.” (Grifos nossos).

Ou seja, o depósito judicial realizado como garantia em cumprimento da obrigação não mais isenta o devedor da responsabilidade quanto aos encargos decorrentes da mora!!!

Portanto, considerando a mudança de entendimento pelo STJ, seria vantajoso economicante ao devedor efetuar o depósito em dinheiro na fase de execução ?

Como visto, caso o devedor opte pelo depósito judicial, seu capital ficará imobilizado e a remuneração pelo Banco depositário será feita, no mínimo, pelo índice da Poupança ou, no máximo, pela Selic (a depender da natureza da ação e do convênio do Banco com o Tribunal de Justiça ao qual tramita o feito).

Por outro lado, caso opte por manter a disponibilidade do seu capital e oferte um Seguro Garantia ao invés do depósito judicial, precisará incluir custo dessa garantia para sua análise financeira. A depender dos riscos de crédito da empresa, estima-se que atualmente esse ônus possa variar de 0,2% a 3% sobre o valor garantido ao ano.

Nesta hipótese, o devedor pode investir esse dinheiro (não imobilizado) no mercado financeiro e, provavelmente, obterá rendimentos maiores se comparado com as atualizações bancárias, incluindo nessa análise o custo com o referido Seguro Garantia.

Assim, além evitar prejuízo futuro com eventual cobrança do valor remanescente decorrente dos encargos de mora em favor do credor, nesta opção, o devedor poderá, inclusive, ter ganho financeiro.

Neste sentido foi, inclusive, o fundamento do voto “vencido” do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, segundo o qual a revisão do Tema tornaria “(…)a execução por quantia certa mais morosa. A primeira consequência seria desestimular devedor de efetuar depósito em dinheiro na fase de execução…” (REsp 1.820.963/SP)

Em todo este cenário, seria então de se questionar quais os possíveis reflexos da revisão do Tema 677 do STJ em se tratando da realização de depósitos judiciais de débitos tributários (notadamente tributos municipais e estaduais, vez que os federais estão sujeitos à mesma atualização aplicada pelos Bancos – Selic).

Fato é que apesar de o Tema 677 do STJ ter sido proferido em ação de cunho cível (e não tributário) e, em que pese as Execuções Fiscais estejam sujeitas à legislação específica, em tese, o novo entendimento pode ter reflexos negativos para os contribuintes nas ações de natureza tributária.

Para ilustrar o caso, imagine-se uma dívida tributária de ITCMD com o Estado de São Paulo. Pois bem, à luz do art. 20 da Lei Estadual nº 10.705/2000, quando o débito do imposto não for pago no prazo, fica sujeito à incidência de juros de mora equivalente à taxa Selic, com proibição de que seja inferior a 1% ao mês.

Em contrapartida, com base no Comunicado nº 1969/2012 da Corregedoria Geral do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, o Banco depositário atualiza os depósitos judiciais nas mesmas bases da remuneração da Caderneta de Poupança, ou seja, com correção monetária da TR acrescida de juros de 0,5% ao mês.

Por óbvio, os rendimentos do depósito judicial sob responsabilidade do Banco são inferiores aos rendimentos adotados pelo Fisco Estadual. Assim, ainda que não se tenha precedente sobre a matéria na seara tributária, as autoridades fazendárias poderão vir a cobrar a diferença dos encargos de mora do contribuinte que depositou (à época) integralmente o valor do débito.

Nesse cenário, a vantagem financeira na oferta de Seguro Garantia em fase de Execução Fiscal, com o consequente investimento do dinheiro no mercado financeiro, tende a ser menor se comparado com os casos cíveis, mas, ainda assim (em tese) é mais vantajoso economicamente ao contribuinte.

Cumpre registrar que em sede de Ação Anulatória de natureza tributária, para o contribuinte obter a suspensão da exigibilidade do crédito não poderá ofertar um Seguro Garantia, já que nos termos do art. 151, II do CTN e da Súmula  n. 112 do STJ, “o depósito somente suspende a exigibilidade do crédito tributário se for integral e em dinheiro.”

Neste caso específico, o contribuinte não tem como fugir da possibilidade de arcar com a diferença dos encargos de mora, caso seja vencido no Ação Anulatória. No entanto, ciente desse risco, o contribuinte bem assessorado não será surpreendido negativamente no futuro.

Diante do exposto, recomenda-se que o devedor sempre faça a reflexão sobre qual opção (depósito ou garantia) é mais vantajosa economicamente para sua empresa, desde que orientado por um advogado especialista.

Caso haja necessidade de maiores esclarecimentos, a Equipe Tributária do Chenut Oliveira Santiago encontra-se à sua disposição.

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