Artigos - Postado em: 17/10/2022

Conheça três vias alternativas para recuperar o seu crédito

Considerando o grande número de processos judiciais que tramitam nos tribunais do país, em que o objeto é a cobranças de dívidas, fica muito evidente que no Brasil o inadimplemento de obrigações financeiras é uma realidade presente e persistente no dia a dia de empresas e pessoas que prestam algum tipo de serviço no mercado.

Diante desse inadimplemento sistêmico, os credores precisam cada vez mais se atentar para formas e estratégias de obter êxito na recuperação do seu crédito, pois ajuizar uma ação não significa que efetivamente será possível forçar o devedor a pagar o que é devido.

O poder judiciário, além de limitado por uma legislação excessivamente protecionista do devedor inadimplente, o que impede por vezes a aplicação de medidas efetivas de expropriação de bens do devedor é, ainda, moroso.

Apesar disso, existem formas legais de se forçar o devedor ao pagamento das suas dívidas, como a penhora de dinheiro, bens móveis e imóveis, direito de crédito, ações e quotas de sociedades empresárias etc., ou ainda, vias excepcionais/extremas de perseguição do crédito, como a desconsideração da personalidade jurídica, a desconsideração inversa da personalidade jurídica e ainda a nova sucessão processual do sócio.

No presente artigo, a ideia é expor de forma prática as três modalidades de desconsideração da personalidade jurídica, apresentando suas principais diferenças, exigências legais para sua configuração e as vantagens que cada instituto apresenta ao credor.

A desconsideração da personalidade jurídica é um instituto já conhecido, tratado no artigo 50 do Código Civil, que permite a inclusão dos sócios de uma determinada Pessoa Jurídica no polo passivo de uma cobrança judicial para responderem (pagarem) com seus bens particulares pelas dívidas daquela sociedade.

Esse procedimento somente é autorizado pelo magistrado em caso de abuso ou de manipulação fraudulenta, sendo tais abusos caracterizados pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial, como por exemplo pagar dívidas particulares com dinheiro da empresa, ou se utilizar da Pessoa Jurídica para ocultar patrimônio (lesando credores), dentre outros atos dolosos.

Por outro lado, com o advento da Lei de liberdade econômica, (Lei n° 13.874/2019) passou a ser possível responsabilizar a empresa/pessoa jurídica pelas dívidas contraídas pelos seus sócios na esfera particular, tal modalidade é denominada desconsideração inversa ou invertida da personalidade jurídica.

Nesse caso, a exigência legal para caracterizar o abuso de personalidade será demonstrar que a pessoa física se utilizou da empresa para proteger/ocultar seu patrimônio pessoal, no intuito claro de se esquivar do pagamento de obrigações financeiras, transferindo formalmente bens particulares para o acervo patrimonial da PJ, por exemplo.

Por certo, não basta apenas alegar que a pessoa física está ocultando seu patrimônio, para ter o benefício concedido pelo magistrado é necessário comprovar formalmente a transferência de bens, apresentando-se no processo documentos que demonstrem tais atos, como escrituras de imóveis, comprovantes de transferências bancárias, documentos de transferência de veículos etc.

À título de curiosidade, um dos primeiros casos de responsabilização de uma PJ por dívidas de pessoas físicas, ocorreu em 1998 no estado de Ohio, quando o First National Bank of Chicago processou a Trebein Company, acusando-a em juízo de criar a empresa com o propósito de fraudar credores, pois para evitar que seu patrimônio fosse consumido por suas dívidas, F.C. Trebein constituiu, com quatro familiares, a empresa Trebein Company, transferindo-lhe todos os seus bens. O argumento foi acolhido pela Suprema Corte de Ohio, que considerou a empresa responsável pelo pagamento das dívidas pessoais de F. C. Trebein.

Tal possibilidade somente foi instituída formalmente no Brasil com a publicação da referida Lei de liberdade econômica em 2019.

Prosseguindo com as hipóteses, outra forma de “invadir” o patrimônio de uma Empresa inadimplente para satisfazer eventuais créditos é por meio da sucessão processual do sócio, sendo que essa modalidade pode ser aplicada sempre que uma empresa tenha encerrado formalmente suas atividades sem quitar suas dívidas.

No caso acima apresentado, os credores daquela pessoa jurídica extinta podem requerer a inclusão dos sócios no polo passivo da ação de cobrança para que cumpram com as obrigações financeiras da PJ que estava sob sua responsabilidade/direção.

Para se obter tal benefício, será necessário apenas demonstrar que a PJ foi extinta e demonstrar quem eram os seus sócios, mas não é preciso comprovar abuso de poder ou desvio de finalidade, apresentando-se até o momento como via processual mais rápida e mais barata para os credores.

Como dito, o Brasil sofre de um inadimplemento sistêmico de obrigações financeiras, sendo de extrema importância não só que o credor se cerque de todos os cuidados quando do estabelecimento da própria relação contratual, como, também, é necessário conhecer as formas especiais de expropriação de bens existentes na legislação, que lhe garanta uma maior efetividade na recuperação de seus créditos, sendo recomendável contar com apoio de equipe jurídica especializada em recuperação de créditos judiciais e em temas empresariais para melhor suporte e análise das estratégias.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002.

BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Institui o Código de Processo Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 março 2015.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. RECURSO ESPECIAL. Terceira Turma. REsp: 1652592 SP 2015/0207688-6, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 06/06/2018. Data de Publicação: DJe 12/06/2018. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/589767246>. Acesso 20 set. 2022.

BRASIL. Lei n° 13.874, de 20 de setembro de 2019. Institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica; estabelece garantias de livre mercado; altera as Leis nos 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), 6.404, de 15 de dezembro de 1976, 11.598, de 3 de dezembro de 2007, 12.682, de 9 de julho de 2012, 6.015, de 31 de dezembro de 1973, 10.522, de 19 de julho de 2002, 8.934, de 18 de novembro 1994, o Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946 e a Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943; revoga a Lei Delegada nº 4, de 26 de setembro de 1962, a Lei nº 11.887, de 24 de dezembro de 2008, e dispositivos do Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966; e dá outras providências. Disponível em: Acesso em 25 set. 2022

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