Artigos - Postado em: 15/04/2024

Breve discussão sobre a validade de cláusulas que limitam responsabilidade contratual

Nathália Faria de Carvalho[1]

As cláusulas que limitam a responsabilidade contratual são comuns em diversos tipos de contratos, incluindo contratos no setor de energia elétrica, mineração, construção e outros setores de relevância na economia nacional. São, em síntese, aquelas que excluem ou atenuam a responsabilidade contratual de uma ou de ambas as partes.

No entanto, a validade dessas cláusulas é frequentemente questionada, especialmente quando há situações que abordam danos significativos ou desequilíbrio contratual.

​Assim, em recente decisão proferida no REsp 1.989.291/SP, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria de votos, reconheceu a legalidade de cláusula limitativa de responsabilidade definida no contrato entre uma empresa multinacional do ramo de tecnologia e uma companhia brasileira que atuava como sua representante no país.

No caso debatido, o TJSP havia concluído que a multinacional teria uma superioridade técnica e econômica, utilizada na situação como mecanismo para aumentar seus lucros e, por isso, afastou a incidência da cláusula contratual de limitação da responsabilidade.

Todavia, já no STJ, a Turma entendeu que o valor máximo para indenização estabelecido previamente pelas partes deveria prevalecer, uma vez que se presume que, ao celebrarem o contrato, as partes avaliaram as vantagens e desvantagens das condições estabelecidas.

Ainda, considerou-se que, ainda que a multinacional realmente detivesse uma posição de superioridade técnica e econômica, a sociedade também é uma empresa de grande porte, o que impede a suposição de que era vulnerável a ponto de não compreender a cláusula contratual.

Logo, se o contrato estabelecer uma cláusula limitativa de responsabilidade para regular os eventuais prejuízos provenientes da relação estabelecida entre as partes, referida disposição não pode ser simplesmente desconsiderada pelo credor, permitindo-lhe cobrar do devedor a integralidade dos danos.

A decisão proferida demonstra-se extremamente relevante, na medida em que prestigia princípios importantes que regem as relações contratuais:

  • Princípio da Autonomia da Vontade: Reconhece que as partes têm liberdade para estabelecer as condições do contrato, desde que respeitada a lei, devendo prevalecer aquilo que foi acordado entre as partes nos casos de contratos paritários;
  • Princípio da Boa-fé: Estabelece que as partes devem agir de boa-fé na negociação e execução do contrato, evitando impor cláusulas abusivas ou desleais;
  • Princípio da Equivalência Material: Ainda assume que o contrato deve respeitar a equivalência material entre as prestações das partes, evitando vantagens excessivas para uma das partes.

Nesse sentido, não há razões para se questionar a aplicação de cláusulas limitativas de responsabilidade contratual em contratos livremente negociados e celebrados por partes iguais. Afinal, a cláusula de limitação da indenização tem a função apenas de limitar o valor indenizatório em caso de dano, o que é plenamente válido.

Cumpre destacar, apenas, que para que não haja dúvidas acerca da validade da cláusula limitativa de responsabilidade, ela deve atender a alguns requisitos:

  • Clareza e Precisão: A cláusula deve ser redigida de forma clara e precisa, para que as partes compreendam o seu alcance e suas limitações;
  • Negociação Livre e Informada: As partes devem negociar a cláusula de forma livre e informada, sem coerção ou manipulação;
  • Não Contrariedade à Lei: A cláusula não pode contrariar disposições legais imperativas, que protegem os direitos fundamentais das partes;
  • Não Abusividade: A cláusula não pode ser abusiva, ou seja, não pode impor uma limitação excessiva ou desproporcional à responsabilidade de uma das partes.

Cumpre ressaltar que, admitir o debate e questionamento a qualquer custo acerca da validade de cláusulas livremente negociadas viola amplamente o princípio da autonomia da vontade das partes, na medida em que, à época do contrato, as partes negociaram e acordaram livremente sobre as condições que regeriam sua relação.

Nesse sentido, a decisão proferida pelo STJ demonstra relevante importância para o cenário econômico nacional – como um verdadeiro avanço – especialmente para as relações entre grandes empresas, pois ratifica os princípios que regem o direito privado, reduzindo a interferência do Estado nas relações privadas.

Assim, o entendimento contribui para sedimentar a legalidade de cláusulas contratuais, permitindo que as partes possam negociar livremente seus contratos, sem receios descabidos de que, posteriormente, o que foi acordado será declarado inválido pelo Poder Judiciário, aumento o grau de confiança nas instituições brasileiras e disposição de empresas internacionais em fazer negócios no Brasil.


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[1] Nathália Faria de Carvalho é advogada no CHENUT e especialista em Contencioso Cível Empresarial.

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