A Jornada do Credor: Desafiando Custos e Obstáculos no Filme da Recuperação de Crédito

Por Rhuana Rodrigues César

Ao assistir ao filme Mad Max: Estrada da Fúria, uma verdadeira montanha-russa de ação e sobrevivência, pode-se pensar em como a jornada do protagonista, Max, poderia ser uma metáfora perfeita para o processo de recuperação de crédito.

Assim como Max, que enfrenta obstáculos aparentemente intransponíveis em um mundo pós-apocalíptico, o credor no Brasil também se vê em uma corrida contra o tempo, tentando recuperar valores enquanto luta contra uma série de desafios – desde as altas custas processuais, a morosidade do Judiciário e os ardilosos meios empregados pelo devedor para ocultar seus bens.

O filme é cheio de ação e resistência, mas também nos faz questionar: até onde podemos ir em busca da vitória quando os custos são altos, as batalhas são longas e não há certeza da vitória?

A busca pela recuperação do crédito pode ser comparada a um verdadeiro filme de ação, onde o protagonista – o credor – enfrenta diversos obstáculos em uma jornada cheia de reviravoltas. Imagine o cenário: ele inicia sua jornada com a esperança de recuperar o valor devido, mas logo se vê diante de custos inesperados e desafios difíceis.

Suas armas iniciais são os procedimentos específicos previstos em lei, como a ação ordinária de cobrança, ação monitória e ação de execução (a senhora das armas). A penhora, adjudicação, leilões e bloqueios seriam o verdadeiro cerco ao devedor, garantindo a efetividade da cobrança e a satisfação do crédito[1].

Neste “filme”, o credor é o herói e o acesso à justiça, seu assistente, que deve vencer essas dificuldades, mas como todo bom filme, o herói também tem um mentor ou estrategista, aquele que guia o credor em sua jornada contra os obstáculos jurídicos e financeiros. Uma referência clássica para esse papel seria Obi-Wan Kenobi, de Star Wars, ou Gandalf, de O Senhor dos Anéis.

Assim como esses personagens, o advogado é aquele que detém o conhecimento sobre as regras do jogo (as leis e procedimentos), fornece as armas certas (estratégias jurídicas) e alerta o credor sobre os perigos ao longo do caminho. No entanto, o advogado não pode lutar todas as batalhas pelo herói – ele ensina, aconselha e estrutura a melhor forma de alcançar a vitória, mas a jornada ainda depende da resistência e estratégia do credor.

Se a trama seguir a lógica de “Mad Max: Estrada da Fúria”, o advogado poderia ser Imperator Furiosa, a estrategista e guerreira que não apenas conhece o terreno hostil, mas também lidera o caminho, enfrentando ameaças e encontrando soluções para desafios aparentemente impossíveis.

O Credor Herói: O acesso à justiça.

Desde a Constituição Federal de 1988[2], o acesso à justiça é a estrela principal desta história. Assim como o assistente do herói de qualquer boa trama – como Alfred para Batman, Hermione para Harry Potter ou Dr. Watson para Sherlock Holmes –, o acesso à justiça tem a missão de garantir que todos (heróis e vilões), sem exceção, possam recorrer ao Judiciário para a defesa de seus direitos.

Porém, ao longo da trama, obstáculos aparecem, e o assistente (acesso à justiça), que deveria tornar tudo mais simples, às vezes acaba tornando o caminho do herói (credor) menos acessível do que deveria ser.

Muitos são os obstáculos, mas de partida, a cobrança das custas iniciais, especialmente nas ações de cobrança, é como aquele inimigo inesperado que aparece no meio do caminho, dificultando o progresso.

Quando essas custas são proporcionais ao valor da causa, como em vários Estados, elas podem ser tão altas que acabam por desencorajar os credores a seguirem. É como se o herói tivesse que atravessar um campo minado de despesas antes de chegar ao objetivo – a recuperação do crédito.

É ter mais prejuízo em troca da expectativa de um caminho mais facilitado por seu assistente. Ledo engano.

A constitucionalidade das custas proporcionais: O STF no papel do diretor.

Assim como em um filme, onde o diretor tem a última palavra sobre a direção da trama, o STF assume o papel de “diretor” do processo judicial sob o aspecto constitucional, definindo as regras e orientações sobre como, por exemplo, as custas processuais devem ser cobradas. Em decisões como a da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3.124[3], o STF validou a cobrança proporcional das custas, pois, acredita que isso garante que o custo do processo seja razoável, de acordo com o valor da causa, que também é matéria sumulada[4].

Entretanto, assim como em um bom roteiro, o STF também reconhece que não basta apenas ter uma regra geral. Ele também estabeleceu, por meio da jurisprudência, que as custas não podem ser sem limites, como uma cobrança exagerada e sem controle que coloca o herói da justiça em uma luta constante contra um inimigo invisível.

O Supremo afirma que, embora seja aceitável que as custas sejam proporcionais, elas devem ser limitadas para garantir que o processo não se torne um fardo financeiro para o credor. Em outras palavras, ele assegura que o herói não fique paralisado diante dos desafios, permitindo que siga em frente e lute por seus direitos até o desfecho justo da história.

A vida como ela é e seu reflexo no roteiro: inadimplência em alta.

O cenário inicial desta trama começa com o retrato da inadimplência no Brasil. De acordo com o Indicador de Inadimplência, elaborado pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), em fevereiro de 2025, 41,50% dos brasileiros adultos estavam com restrições no nome, totalizando 68,76 milhões de consumidores negativados. Esse número representa um aumento de 3,22% em relação ao mesmo período de 2024[5].

[6]

Este cenário, onde a trama se inicia, já deixa claro a grandiosidade do desafio que o herói enfrentará ao longo do caminho.

O Vilão: O devedor e seus truques.

Como em qualquer filme, o vilão tem suas estratégias para escapar. No mundo das ações de cobrança, o devedor recorre a manobras para dificultar a localização de bens ou até mesmo para ocultá-los, criando uma trama complexa que prolonga a recuperação do crédito.

Ele pode transferir propriedades para terceiros, esvaziar contas ou simplesmente fazer de tudo para esconder o que possui, criando uma luta constante entre o credor e seu personagem fugitivo.

Esses artifícios são como as armadilhas que o herói enfrenta em sua jornada – obstáculos que surgem quando o herói parece mais próximo da vitória. Para o credor, é preciso recorrer muitas vezes às técnicas qualificadas para contornar essas dificuldades, como a quebra de sigilo bancário, a pesquisa patrimonial e a análise detalhada de bens ocultos, o que significa mais custo.

As diligências, executadas pelos oficiais de justiça, acabam sendo um ponto crítico. Muitas vezes, esses profissionais não conseguem localizar o devedor, ou suas diligências são ineficazes, prolongando ainda mais a batalha pela recuperação do crédito.

Esses obstáculos, que em um filme seriam chamados de “interferências”, estão sempre à espreita no caminho do credor. Cada diligência não realizada corretamente ou infrutífera, cada bem oculto e cada passo em falso cria um desafio, uma nova ação a ser tomada pelo herói, o credor. Assim, o processo de recuperação se torna uma série de testes, onde cada movimento tem seu custo.

O Vilão Qualificado: O Estado.

Em algumas tramas, o vilão é ainda mais perigoso, mais qualificado e praticamente imbatível – e esse vilão é o Estado. Quando a dívida envolve um ente público, o processo de cobrança se torna ainda mais complexo e desafiador. A cobrança do Estado tem suas próprias regras, que tornam a execução mais morosa, burocrática e, muitas vezes, sem garantias de sucesso, apesar do suposto pagamento certo via precatório.

O credor se vê em uma batalha ainda mais difícil, onde o Estado, em vez de ser uma parte acessível da justiça, se torna um adversário que impõe obstáculos desnecessários, tudo apenas para adiar o inevitável. A execução contra o Estado, longe de ser simples, exige um nível de paciência e resiliência que faz o processo se arrastar por anos, como um roteiro de filme monótono em que os cinéfilos abandonam logo no início.

As ações judiciais contra o Estado, que envolvem uma série de recursos e medidas protelatórias, são como enfrentar um vilão em um filme em que, a cada passo dado pelo herói, o inimigo encontra uma nova forma de escapar, mas lenta e gradativamente construída.

O tempo de tramitação dessas ações é mais longo, e os credores, por muitas vezes, apesar de o recebimento em tese ser certo (via precatório), podem falir ou morrer antes mesmo de ver a cor de seu crédito, ou seja, morem na praia, já que por vezes são dez anos para o desfecho da ação e mais 10 anos para o recebimento do precatório em condições gerais.

O custo das diligências e custas: interferências sempre à espreita.

Voltando às interferências, ao considerar o custo das diligências e custas iniciais no processo de recuperação de crédito, pode-se ver como essas são quase invisíveis, mas presentes a cada momento.

Imagine que, enquanto o herói tenta atravessar um campo minado, ele tem que passar por diversas armadilhas invisíveis – as custas e as diligências são essas armadilhas, que constantemente, apesar de facilitarem o progresso, aumentam o prejuízo do credor.

As custas iniciais do processo, como antes dito, podem ser um obstáculo considerável, especialmente nos tribunais mais caros como os de São Paulo e Rio de Janeiro, onde as taxas são elevadas e podem representar um gasto significativo logo no início.

Dependendo do valor da causa, o credor se vê com custos iniciais que podem superar os 3% do montante devido, o que representa uma verdadeira “barreira de entrada” ao processo judicial.

Como em uma história baseada em “fatos reais”, imagine que para recuperar um crédito em SP, no valor aproximado de R$ 470.000,00, o herói de imediato deve desembolsar cerca de R$ 4.200,00, sendo que desde 2023 já gastou mais R$ 1.400,00 para recuperar cerca de 2,98% de seu crédito[7].

Mas o verdadeiro desafio está nas diligências, que muitas vezes não são eficazes e se tornam obstáculos recorrentes.

Em um processo de execução, por exemplo, uma diligência de citação ou penhora de bens pode ter um custo médio de R$ 100 a R$ 500, dependendo da complexidade da ação e da localidade, bem como da quantidade de réus.

No entanto, se o devedor se mostra evasivo e a diligência não for realizada com sucesso, o credor não apenas perde o valor pago, como também tem que arcar com novas tentativas de localização e apreensão, perpetuando o ciclo de custos adicionais.

Além disso, o tempo é outra interferência constante. A demora para que uma diligência seja realizada e para que o processo avance no Judiciário é uma constante preocupação. Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apontam que as execuções cíveis podem levar, em média, entre 7 e 8 anos para serem concluídas, dependendo da instância e da complexidade[8].

Levando-se em consideração os processos de execução de títulos executivos extrajudiciais não fiscais, avaliados para os Tribunais de Justiça e os Tribunais Regionais Federais, o índice de conciliação foi de apenas 26,8%[9].

A cada passo que o credor tenta dar, surgem novas exigências de diligência, e cada uma delas traz um custo. O tempo gasto nesses processos é, muitas vezes, irreversível, pois, as dívidas se acumulam e o valor da recuperação vai diminuindo com o tempo diante de tantas despesas já incorridas e a inexistência de bens.

O Final Feliz: Um acesso à justiça eficiente.

Em um bom filme, o herói finalmente consegue alcançar seu objetivo, superando todos os obstáculos. No entanto, no enredo da recuperação de crédito, isso só é possível quando o custo das custas judiciais não é um empecilho insuperável, a assistência do herói é efetiva e seu mentor lhe dá as melhores chances de vitória.

O STF, ao garantir a constitucionalidade das custas proporcionais, também deixa claro que o “final feliz” deve ser acessível a todos, e que as custas não devem se tornar um obstáculo ao direito fundamental de acesso à justiça.

Por isso, é fundamental que as regras de cobrança de custas sejam revisadas, buscando um equilíbrio que permita que as ações de execução sejam viáveis, sem prejudicar as partes envolvidas.

Assim, ao final do filme da recuperação de crédito, o acesso à justiça deve, também, se tornar vencedor, garantindo que todos tenham uma chance justa de buscar o que é seu por direito, com custas razoáveis e um processo eficiente.

O desfecho até agora: um final incerto?

Apesar dos esforços para tornar o acesso à justiça mais eficiente, o filme da recuperação de crédito no Brasil tende a terminar de uma maneira um tanto quanto sombria, se certas posturas não forem adotadas.

No cenário atual, em que as custas são elevadas e o tempo de tramitação das execuções cíveis é excessivo, muitos credores acabam desistindo de buscar seus direitos. O “final feliz” que imaginamos para a recuperação de crédito muitas vezes não se concretiza, pois, o processo acaba sendo um jogo de paciência e recursos financeiros, sem garantir a efetiva recuperação do valor devido.

A luta contra as altas custas e a morosidade do Judiciário, portanto, continua sendo o grande obstáculo. Se o cenário não mudar, o filme da recuperação de crédito pode seguir como uma história interminável, onde o herói – o credor – acaba se esgotando antes de alcançar sua vitória. O “vilão”, neste caso, se torna o sistema judicial que, em vez de facilitar o acesso à justiça, impõe barreiras financeiras e processuais que afastam a possibilidade de um desfecho positivo.

O grande desafio é reescrever esse enredo, com mudanças que permitam que o acesso à justiça se torne uma realidade eficaz para todos os cidadãos, não apenas para aqueles com recursos suficientes para contar com o melhor mentor e enfrentar um sistema custoso e demorado, além das artimanhas do devedor.

O final do filme ainda está em aberto, mas, para que o “herói” saia vitorioso, é preferível dizer que as regras do jogo sejam repensadas e inovações nas posturas adotadas sejam aplicadas.

O Plano de Sobrevivência: Estratégias para a vitória.

Retomando Mad Max: Estrada da Fúria, a fuga dos protagonistas pelo deserto não é uma ação impulsiva – é um plano meticuloso, onde cada recurso é utilizado com precisão para garantir a sobrevivência.

Da mesma forma, o credor, nosso herói, precisa adotar estratégias inteligentes para evitar armadilhas e aumentar suas chances de sucesso na recuperação do crédito e assim mudar o final do filme.

Se considerarmos que o advogado é o mentor na jornada do credor para a recuperação de crédito, sua atuação deveria seguir a lógica de personagens como Obi-Wan Kenobi, Gandalf ou Imperator Furiosa:

Fornecer conhecimento e estratégia – O advogado deve mostrar ao credor todas as ferramentas jurídicas disponíveis (ação de cobrança, monitória, execução, penhora, adjudicação etc.), explicando os prós e contras de cada uma, para que ele possa escolher o melhor caminho com consciência dos riscos[10].

Escolha do Melhor Caminho: Análise de viabilidade antes da ação.

Antes de iniciar a jornada, Furiosa e Max analisam rotas, abastecimento e possibilidades de refúgio. O credor deve fazer o mesmo: avaliar a situação financeira do devedor, mapear bens disponíveis e entender se vale a pena entrar nessa estrada ou buscar um caminho alternativo, a exemplo de estender a esteira para uma cobrança extrajudicial mais longa.

Preparar o credor para os desafios – Assim como um mentor avisa o herói sobre as armadilhas que enfrentará, o advogado deve alertar o credor sobre custas processuais, dificuldades na localização de bens e tempo de tramitação do processo, evitando expectativas irreais e ajudando a calcular o custo-benefício da jornada.

Criar atalhos e táticas inteligentes – Como Furiosa, que traça um plano para escapar pelo deserto, o advogado deve encontrar maneiras de acelerar o processo, sugerindo acordos vantajosos, uso eficiente de medidas como a pesquisa patrimonial e identificação de ativos ocultos, além de evitar desperdício de recursos com diligências ineficazes.

Arsenal Preparado: uso inteligente de ferramentas judiciais.

Assim como os personagens utilizam armas e veículos adaptados para enfrentar o deserto hostil, o credor precisa recorrer a todas as ferramentas disponíveis para aumentar suas chances de sucesso na recuperação do crédito.

Além do Sisbajud para bloqueio de valores, Renajud para restrição de veículos e o InfoJud para acessar declarações fiscais, ele pode utilizar o SNIPER para rastreamento patrimonial, e o CNIB para identificar imóveis indisponíveis, além de diversas medidas atípicas[11] que ainda estão em construção e validação pela jurisprudência, como a penhora de créditos em plataformas de jogos online[12].

Liderar nos momentos críticos – Quando o herói está prestes a desistir, o mentor é aquele que o lembra do seu objetivo e o incentiva a continuar. O advogado deve atuar da mesma forma, ajudando o credor a não perder oportunidades estratégicas, como insistir na penhora de um bem ou adotar uma abordagem mais agressiva na cobrança.

Adaptar-se ao roteiro do Judiciário – Assim como um mentor entende que a jornada do herói pode mudar no meio do caminho, o advogado deve estar pronto para redirecionar a estratégia quando necessário, seja diante de um recurso inesperado do devedor ou de uma nova decisão judicial que afete a execução.

Monitoramento Contínuo: O olho no horizonte.

No filme, qualquer descuido pode ser fatal. A cada avanço, os protagonistas precisam estar atentos ao que acontece ao redor. O credor e seu mentor devem monitorar constantemente os bens e movimentações do devedor, impedindo que ele drible a execução e desapareça com o patrimônio[13].

Negociações Estratégicas: quando parar para reabastecer.

Nem toda batalha precisa ser vencida no combate direto. No meio da jornada, negociações podem ser a melhor alternativa para economizar recursos e garantir o objetivo final. O credor deve investir em tentativas constantes de acordo, seja por renegociação de dívida, mediação ou conciliação, buscando soluções extrajudiciais que sejam mais rápidas e eficazes.

Recursos de Sobrevivência: estratégias alternativas.

Quando as rotas tradicionais falham, Max e Furiosa precisam encontrar caminhos alternativos para sobreviver, utilizando criatividade e inteligência para superar os obstáculos.

Da mesma forma, o credor não pode se limitar às ferramentas mais óbvias e deve explorar novas estratégias para localizar bens e garantir o cumprimento da execução.

Além dos sistemas tradicionais, é possível recorrer à investigação de redes sociais, pesquisas na web, consulta de procurações em cartórios, atualização do estado civil do devedor, acesso ao Portal da Transparência, diligências locais para verificação de bens e endereços, análise de escrituras de doações, identificação de ações judiciais nas quais o devedor seja credor, levantamento de inventários em andamento e, se for o caso (a luta justificar o resultado), utilizar serviços de investigação pessoal particular[14].

O sucesso na execução exige mais do que apenas ferramentas jurídicas; requer criatividade e uma abordagem investigativa para fechar todas as rotas de fuga do devedor.

Pensando nisso e nas próximas cenas, seria ainda possível pensar em pedir ao assistente do herói, por meio de seu mentor, inspirado no artigo 835 do CPC (penhora de bens e direitos), uma medida inovadora, qual seja, que o devedor pessoa jurídica seja impedido de participar de licitações públicas enquanto permanecer inadimplente.

Com base no princípio da efetividade da execução (art. 797 do CPC), o credor poderia requerer que instituições financeiras fossem notificadas sobre a inadimplência, dificultando a concessão de novos empréstimos ao devedor.

Muitas vezes, o devedor tenta ocultar patrimônio por meio da alienação de cotas societárias para terceiros. O credor pode pedir a restrição da venda de cotas até a quitação da dívida, conforme permitido pelo artigo 139, IV, do CPC.

Não deixar a poeira assentar: Cobrança ativa do processo.

Em Mad Max, a inércia significa morte. Se os protagonistas pararem, serão alcançados e aniquilados pelos inimigos. Da mesma forma, no processo de execução, a inércia também pode ser fatal.

Se o credor não mantiver o processo em movimento – cobrando o Judiciário, pressionando por decisões ágeis e evitando que sua demanda se perca nas pilhas de processos – corre o risco de ver seu direito simplesmente desaparecer.

E é nesse momento que surge um novo vilão, tão implacável quanto qualquer perseguidor no deserto: a prescrição, que decreta a morte do processo, extinguindo definitivamente o direito do credor e tornando toda a luta em vão.

Prevenção para o futuro: aprender com a jornada.

No final do filme, os sobreviventes sabem que, para manter seu futuro seguro, precisam adotar novas práticas. O credor pode aprender com cada caso, estabelecendo políticas de crédito mais rígidas, avaliando melhor seus clientes e implementando medidas para minimizar riscos de inadimplência no futuro.

Criatividade no roteiro vs. criatividade jurídica na satisfação de crédito.

Se pensarmos no roteiro cinematográfico, o mentor tem um papel fundamental: ele não apenas orienta o protagonista, mas frequentemente o impulsiona por caminhos inesperados, desafiando suas crenças e apresentando soluções que ele jamais imaginaria sozinho.

No cinema, grandes mentores são aqueles que quebram padrões e fazem o protagonista olhar para o problema de um jeito novo.

No direito, o advogado que busca a satisfação do crédito deve atuar como esse mentor criativo, explorando alternativas inovadoras para vencer a resistência do devedor. Assim como um roteirista pensa fora da caixa para criar reviravoltas emocionantes, o advogado precisa surpreender o sistema jurídico e o próprio devedor, trazendo soluções inesperadas.

Comparemos estratégias do roteiro com medidas que podem ser inovadoras para a cobrança:

Mentor que impõe restrições e gera conflito:

No cinema, o mentor pode colocar obstáculos para que o protagonista saia da zona de conforto. No direito, poder-se-ia pensar em proibição de viagens internacionais para devedores. Ao impedir uma vida de luxo para quem diz não ter dinheiro, gera-se um choque na estratégia de inadimplência e força-se a negociação.

Com fundamento no art. 139, IV do CPC, seria possível requerer ao juiz essa providência, que pode ser inspirada na mesma lógica imposta ao judiciário para pais inadimplentes em pensão alimentícia.

Assim como um mentor impede atalhos fáceis para que o protagonista cresça, o advogado deve impedir que o devedor continue usufruindo de benefícios enquanto ignora suas obrigações.

Nomeação de “gestores judiciais” para empresas devedoras:

Se o devedor é empresário e sua empresa não paga credores, um gestor judicial poderia ser nomeado para administrar receitas e garantir que parte dos lucros vá para quitar dívidas antes que os sócios retirem dividendos. Essa prática já existe na recuperação judicial, mas por que não aplicá-la ainda quando a empresa se mostra capaz de saldar suas dívidas sem impor aos credores um deságio que beira o calote? A base legal seria o art. 866 do CPC, utilizando-se da analogia da intervenção judicial.

Confisco de Direitos Digitais e Monetização de Ativos Virtuais:

No cinema, muitas vezes, o mentor apresenta um método inesperado para resolver o problema (ex.: Yoda ensinando Luke a usar a Força em vez de confiar apenas na espada). No direito, o confisco de direitos digitais e monetização de ativos virtuais também pode apresentar-se como um método inesperado.

Com base no art. 835 do CPC, advogados podem pedir a penhora de canais de YouTube, contas de streaming ou criptomoedas, perfis de redes sociais monetizados, NFTs, criptomoedas e até terrenos no metaverso.

Restrição ao uso de aplicativos de luxo (iFood, Uber Black, Prime, etc.):

Considerando o disposto no art. 139, IV do CPC e o fato de o devedor declarar ou demonstrar que não tem condições de pagar a dívida, poder-se-ia requerer ao juiz a restrição de uso desses aplicativos.

Reverse Blocking: Penhora de Valores de Clientes do Devedor:

Algumas histórias ensinam o protagonista a vencer o inimigo jogando com as mesmas regras dele. No direito, em vez de esperar que o devedor pague, o advogado pode agir para que os próprios clientes do devedor depositem valores direto na execução, com base no art. 854 do CPC.

Uso Estratégico da Reputação Pública:

Para empresas devedoras, use ações judiciais para alertar stakeholders e reguladores sobre riscos financeiros. Se a empresa tem certificações ESG ou contratos públicos, demonstre que sua inadimplência pode impactar sua reputação.

Para prestadoras de serviço reguladas (bancos, planos de saúde, seguradoras), peça a notificação de órgãos reguladores (exemplo: Banco Central, ANS, CVM). Muitas dessas empresas preferem quitar débitos rapidamente para evitar questionamentos formais.

O desfecho: uma nova perspectiva para o credor.

Se o cenário atual do Brasil fosse um filme, muitos credores se sentiriam presos em uma trama sem fim. No entanto, a adoção de estratégias inteligentes pode mudar o curso da história.

A preparação cuidadosa antes da distribuição do processo, aliada ao uso de ferramentas adequadas e ao monitoramento constante, pode transformar a luta pela recuperação de crédito em uma jornada mais eficaz e, acima de tudo, vitoriosa.

A justiça pode ser um campo de batalha, mas com a estratégia certa, o credor pode reescrever sua história e garantir um final digno de Oscar.

Agora, cabe a você escolher qual estratégia se encaixa melhor no seu caso. Por onde pretende começar?

O CHENUT alcançou por nove vezes o 1° lugar como o escritório mais admira-do de Minas Gerais pela publicação Análise Editorial ADVOCACIA. Quer conhecer mais sobre a nossa Equipe e nossos serviços? Entre em contato com novosnego-cios@chenut.online e agende uma conversa.

Rhuana César

 


[1] Art. 789: O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações.

Art. 797: A execução se realiza no interesse do credor, permitindo que ele busque o pagamento forçado.

 

[2] O artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal de 1988, trata do acesso à justiça. Ele estabelece o princípio da inafastabilidade da jurisdição:

“A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”

 

[4] Súmula 667: Viola a garantia constitucional de acesso à jurisdição a taxa judiciária calculada sem limite sobre o valor da causa.

[6] Idem. Acessado em 01/04/2025.

[7] TJSP, 2ª Vara Cível, Processo n. 1015379-10.2023.8.26.0405.

[9] Idem. Fl. 254.

[10] Procedimentos de cobrança:

Art. 784: Define os títulos executivos extrajudiciais, que permitem cobrança direta sem necessidade de um processo de conhecimento prévio.

Art. 785: Permite que o credor cobre valores via execução judicial quando possuir um título executivo.

Art. 700: Regula a ação monitória, facilitando a cobrança quando não há título executivo, permitindo que o credor obtenha um título judicial mais rapidamente.

[11] artigo 139, inciso IV, do Código de Processo Civil.

[12] Meios de busca de bens do devedor:

Art. 833: Define quais bens são impenhoráveis (salário, pequenos valores em conta, bens de uso essencial etc.), evitando gastos desnecessários com penhoras inviáveis.

Art. 834 e 835: Permitem a penhora de bens do devedor para garantir a satisfação do crédito, priorizando dinheiro em espécie (via BacenJud), mas incluindo veículos, imóveis e outros ativos.

Art. 854: Possibilita o bloqueio de valores via BacenJud diretamente em contas bancárias do devedor.

Art. 860: Permite que o credor adjudique os bens penhorados, ou seja, fique com o bem para compensar a dívida.

[13] Medidas contra fraudes e ocultação de bens:

Art. 792: Trata da fraude à execução, permitindo que o credor anule transferências fraudulentas de bens feitas pelo devedor para evitar o pagamento.

Art. 828: Permite que o credor registre a penhora na matrícula de imóveis do devedor, impedindo a venda irregular do bem.

Art. 139, IV: Autoriza o juiz a determinar medidas coercitivas contra devedores que tentam frustrar o cumprimento da obrigação, como suspensão de passaporte, CNH e bloqueio de cartões de crédito.

 

[14] Medidas contra empresa

Compartilhe: