Por Beatriz Balas Toledo
A recente regulamentação do mercado de apostas esportivas e jogos online trouxe avanços relevantes, mas também acendeu alertas sobre potenciais abusos tributários. Em meio a esse cenário, chama atenção a instituição da chamada “Taxa de Fiscalização” pela Lei nº 13.756/2018 (alterada pela Lei nº 14.790/2023), incidente sobre a atividade das operadoras de apostas de quota fixa – as chamadas “bet’s”.
Essa exação foi regulamentada pela IN SPA/MF nº 9/2025, e é mensalmente exigida com base no produto da arrecadação das apostas, após dedução dos valores destinados ao pagamento de prêmios, contribuição à seguridade social e imposto de renda sobre a premiação. O valor restante, denominado “arrecadação líquida”, enquadra-se em faixas escalonadas previstas no Anexo II da legislação.
A polêmica surge do fato de que essa taxa, embora rotulada como contraprestação pelo exercício do poder de polícia, não guarda qualquer relação proporcional com o custo efetivo da atividade estatal de fiscalização. Na prática, seu valor é ditado exclusivamente pela arrecadação das operadoras, elemento que expressa capacidade contributiva, critério próprio de impostos, não de taxas.
Do ponto de vista jurídico-constitucional, essa sistemática afronta o art. 145, II, §2º, da CF, que veda expressamente a adoção de base de cálculo própria de impostos para a cobrança de taxas. Além disso, viola os princípios da legalidade, razoabilidade, proporcionalidade, vedação ao confisco e da retributividade, amplamente consagrados pela jurisprudência do STF.
A situação se agrava quando se analisam os valores concretamente arrecadados. Segundo notícia do jornal Valor Econômico de 19/03/2025, estima-se que a Taxa de Fiscalização renderá aos cofres da União cerca de R$ 1,9 bilhão por ano. Tal montante é, juridicamente, desproporcional ao custo real de fiscalização, especialmente considerando que o próprio procedimento de controle é automatizado, realizado por sistemas auditáveis mantidos pelas próprias empresas, com acesso em tempo real pela Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda.
A jurisprudência é clara no sentido de que as taxas devem manter relação razoável com o custo da atuação estatal, sob pena de desnaturar sua essência. O STF, ao julgar o RE 576.321 (Tema 146), firmou tese no sentido de que não se exige correspondência exata entre valor cobrado e custo estatal, mas é obrigatória uma equivalência razoável.
Já no RE 838.284 (Tema 829), reafirmou a possibilidade de delegação infralegal da fixação da taxa, desde que respeitada a proporcionalidade com o custo da atividade pública.
Nesse sentido, ao vincular a Taxa de Fiscalização à arrecadação das empresas, o que se vê é a adoção de critério meramente econômico. Aumento de faturamento implica aumento da taxa, sem qualquer correlação com maior atuação do poder público. Essa distorção converte a taxa em verdadeiro imposto disfarçado, violando frontalmente o pacto federativo e os limites do poder de tributar.
Não se nega que a consolidação de normas para regulamentação das bets é imprescindível, tanto para uma gestão pública efetiva quanto à segurança jurídica do setor. Contudo, é indispensável que sejam observados os ditames da lei, ou seja, que a cobrança da taxa corresponda efetivamente aos custos envolvidos na fiscalização – ou ao menos, equivalência razoável.
Trata-se de questão jurídica sensível e urgente, que exige atenção das operadoras do setor. A falta de ação pode significar uma carga tributária desarrazoada e potencialmente inconstitucional, impactando severamente a rentabilidade e a segurança jurídica da atividade econômica.
Estamos à disposição para assessorá-lo na análise das obrigações regulatórias e estratégias judiciais cabíveis, sobretudo para mitigar os seus efeitos quanto à implementação da atual sistemática de cálculo da taxa, oferecendo uma visão técnica, preventiva e combativa para evitar a manutenção de cobranças indevidas no setor de apostas de quota fixa.
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