Por Fernanda Assis Souza
A nova NR-1 representa um verdadeiro marco na saúde e segurança do trabalho (SST), ao colocar o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO) como eixo central. Agora, não basta apenas cumprir obrigações legais: as empresas precisam identificar, avaliar, controlar e monitorar riscos de forma contínua, integrando essas práticas à gestão estratégica do negócio.
Uma inovação significativa da norma é a inclusão explícita dos riscos psicossociais — como assédio moral, sobrecarga de trabalho, pressões excessivas e ambientes hostis. Antes pouco discutidos, esses fatores impactam diretamente a saúde mental, o bem-estar e a produtividade dos trabalhadores, além de gerar potenciais passivos legais e repercussões reputacionais.
Na prática, a NR-1 amplia o foco da SST: além de riscos físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e de acidentes, a empresa deve agora atuar para prevenir danos invisíveis, promovendo um ambiente de trabalho seguro e saudável. Não é apenas uma atualização normativa: é um novo paradigma de gestão, em que a SST se torna uma estratégia de sustentabilidade e responsabilidade corporativa.
Um desafio corporativo transversal
Implementar a NR-1 exige ação integrada de várias áreas da empresa: RH, Jurídico, Compliance, líderes e alta gestão. A norma transforma a maneira como a organização entende e gerencia os riscos internos, tornando cada área uma peça-chave nessa engrenagem.
Exemplos práticos de como cada área pode contribuir:
- RH: implementar pesquisas de clima organizacional, avaliações de sobrecarga de trabalho e programas de prevenção de assédio, integrando resultados ao plano de desenvolvimento de lideranças.
- Jurídico: revisar contratos, políticas internas e procedimentos disciplinares para garantir conformidade com normas trabalhistas e proteger a empresa de passivos legais.
- Gestão e líderes: monitorar cargas de trabalho, promover feedbacks contínuos e identificar sinais de estresse ou conflitos na equipe, agindo preventivamente.
- SST e GRO: aplicar checklists de riscos, mapear processos críticos e indicadores de saúde ocupacional, como absenteísmo, acidentes e episódios de estresse elevado.
- Compliance: monitorar o cumprimento de leis, normas e políticas internas, assegurar que os riscos psicossociais sejam gerenciados de forma consistente e ética, e orientar áreas sobre controles preventivos e mitigação de passivos legais e reputacionais.
Dessa forma, questões como assédio moral, sobrecarga de trabalho e pressões desmedidas deixam de ser apenas “temas de RH” ou “problemas de gestão”, e passam a ser riscos ocupacionais reconhecidos, exigindo medidas formais de prevenção e mitigação.
Compliance e NR-1: uma conexão estratégica
A nova NR-1 trouxe um olhar mais abrangente sobre a saúde mental e emocional das equipes, transformando o cuidado com as pessoas em uma exigência legal. Nesse contexto, o Compliance assume um papel crucial: assegurar que a organização siga leis, normas e padrões éticos, prevenindo passivos legais, fiscalizações e crises reputacionais. Ignorar os riscos psicossociais significa falhar nessa missão estratégica.
Quando Compliance e NR-1 atuam juntos, os resultados vão muito além da conformidade: constroem uma cultura de prevenção, integridade e cuidado com as pessoas, refletida em:
- Ambiente saudável: redução de adoecimento, absenteísmo e aumento do engajamento.
- Menos riscos legais: cumprimento das normas trabalhistas e de SST, evitando multas e processos.
- Reputação fortalecida: empresa percebida como ética, responsável e preocupada com seu time.
- Sustentabilidade do negócio: equipes mais produtivas, inovadoras e resilientes, com menor rotatividade.
Na prática, essa integração pode se materializar em diversas frentes:
- Mapeamento de riscos: utilizar matrizes de probabilidade e impacto para priorizar áreas críticas, como setores com histórico de alta rotatividade ou absenteísmo.
- Treinamentos periódicos: capacitar líderes em comunicação, gestão de conflitos e prevenção de assédio.
- Monitoramento contínuo: aplicar questionários de satisfação, indicadores de saúde mental e canais de denúncia confiáveis, com análise de dados para ações corretivas.
- Políticas claras: documentar normas sobre jornada de trabalho, home office, pausas e limites de sobrecarga, garantindo que sejam conhecidas e aplicadas.
Assim, uma atuação conjunta do Compliance e da NR-1 transforma a conformidade em ação estratégica: ao cuidar de riscos psicossociais e promover uma cultura de prevenção, a empresa não apenas cumpre a lei, mas fortalece seu ambiente interno e protege seu time.
O recado final
A NR-1 convida as empresas a revisarem políticas, treinamentos e processos, transformando o bem-estar das pessoas em parte da estratégia corporativa. Nesse cenário, o Compliance não pode ficar de fora: ignorar os riscos psicossociais significa perder seu papel estratégico e reduzir-se a mera burocracia documental.
NR-1 e Compliance não competem: eles se complementam.
Juntos, formam uma estratégia poderosa de proteção do negócio e cuidado com as pessoas, traduzindo obrigação legal em governança corporativa de impacto.