“Jogada de mestre” ou cilada digital? A CPI das Apostas acendeu o alerta: não basta ser famoso, é preciso ser diligente — porque o Código de Defesa do Consumidor também está online.

Introdução.

“Ganhe dinheiro do sofá de casa”, “Transforme R$ 10 em R$ 10 mil”, “Use meu código e jogue grátis” — frases como essas se espalharam pelas redes sociais como um vício digital.

No centro da narrativa estão os influenciadores, que, com milhões de seguidores, promovem plataformas de apostas online com a mesma naturalidade com que indicam produtos de skincare. Mas quando a roleta gira fora dos trilhos da legalidade, quem segura a conta?

Em tempos de CPI das Apostas Esportivas, que escancara um mercado em processo de regulamentação no Brasil, o debate sobre a responsabilidade dos influenciadores digitais na promoção dessas plataformas ganha destaque — e urgência.

Influência com CPF: o peso jurídico da fama.

A atuação dos influenciadores não é apenas comunicacional, mas comercial e contratual, pois muitos atuam como verdadeiros agentes publicitários, sendo remunerados por visualizações, conversões e códigos promocionais utilizados.

E nessa condição, pode-se defender o enquadramento como fornecedores, nos termos do art. 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), respondendo solidariamente por eventuais danos causados aos consumidores (art. 7º, parágrafo único, e art. 14, CDC).

Segundo um levantamento da INFLR, uma startup que conecta marcas a personalidades populares nas redes, 75% dos jovens se interessam em ingressar no mundo da influência, sendo que 63% são motivados pelo retorno financeiro¹ , o que revela por outro ângulo, a capilaridade dos nanos aos megas influenciadores.

E a relação de confiança, construída com o público ao longo do tempo, impõe também deveres de diligência, transparência e cuidado. Quando se divulga uma plataforma — especialmente do setor de apostas —, o influenciador deve ter clareza de que sua indicação carrega um peso que vai além do “link na bio”.

Isso porque os influenciadores devem estar cientes das responsabilidades jurídicas que acompanham sua influência, inclusive penal, uma realidade que não pode ser ignorada.

Os Influenciadores podem e devem ser responsabilizados por danos causados por suas ações ou omissões, especialmente quando essas ações resultam em consequências negativas para seus seguidores e no mundo real, as apostas online podem não ser apenas um entretenimento.

Os riscos silenciosos das apostas: do vício à vulnerabilidade extrema

Embora legalizadas e regulamentadas em determinadas modalidades, essas atividades envolvem potencial de vício, sobretudo quando promovidas de forma acrítica, impulsiva ou com promessas irreais de enriquecimento fácil.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica o vício em jogos como um transtorno do comportamento, incluído na 11ª edição da Classificação Internacional de Doenças (CID-11), sob o código “6C50 – Comportamento de jogo patológico”².

Já estudos conduzidos por instituições como o National Health Service (NHS) do Reino Unido identificam correlação direta entre o uso intensivo de plataformas de apostas e o aumento de quadros de depressão, ansiedade, endividamento e risco de suicídio³ .

O problema se agrava, quando se vê influenciadores com milhões de seguidores promovendo plataformas com frases como “dá pra viver disso”, muitos usuários — especialmente jovens — acreditam estar diante de uma oportunidade legítima de mobilidade social, o que pode desencadear compulsão, descontrole financeiro e sofrimento psicológico.

O Brasil, segundo o Estudo Global sobre Jogos de Azar do DataHub (2022) já figura entre os 10 países com maior número de usuários em plataformas de apostas esportivas, com crescimento de 360% no número de contas ativas em dois anos, o que revela a necessidade de uma açao preventiva⁴‬ .

Nesse passo, a Lei nº 14.790/2023, que regulamenta as apostas de quota fixa, prevê dispositivos de proteção ao consumidor, como a exigência de políticas de prevenção ao jogo problemático, canais de autoexclusão, restrição a menores de idade e a obrigação de implementar ferramentas de limite de gasto e tempo de conexão.

Tais medidas, porém, ainda carecem de regulamentação complementar e fiscalização eficaz, a despeito de muitas empresas (as sérias) já possuírem programas de prevenção ao jogo irresponsável.

E neste contexto, a publicidade — sobretudo aquela feita por influenciadores — precisa respeitar os limites da ética e do direito.

Quando o influenciador promove uma atividade potencialmente aditiva sem alertar sobre seus riscos, pode estar incorrendo em omissão dolosa ou culpa por negligência, especialmente considerando o dever de informação previsto no art. 6º, III, do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e a vedação à publicidade enganosa ou abusiva (arts. 36 e 37, CDC).

Em países como o Reino Unido e a Austrália, o uso de influenciadores digitais para promover apostas a menores foi restrito por lei, após estudos revelarem a influência desproporcional dessas figuras sobre decisões impulsivas de consumo.

Por isso, cresce a pressão para que o Brasil avance também no controle da linguagem publicitária no setor, inclusive com apoio de autorregulação, como previsto no Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (CONAR)⁵.

E Ignorar os efeitos colaterais das apostas é negligenciar vidas. A publicidade deve ser orientada pelo princípio da boa-fé objetiva e pelo respeito à dignidade humana.

As Campanhas que não alertam sobre os riscos ou que incentivam comportamentos compulsivos, violam normas legais e éticas, e podem gerar responsabilização civil, administrativa e até penal, a depender do caso concreto.

Em última instância, é preciso lembrar: o que para um é conteúdo, para outro pode ser gatilho. E quando a aposta vira dependência, o prejuízo é humano — e, às vezes, irreversível.

Apostas legalizadas (mas nem todas).

A verdade é que há diversas empresas sérias e regulares operando no Brasil, respeitando o marco normativo estabelecido pela Lei nº 14.790/2023, que regulamenta as chamadas apostas de quota fixa e todos os outros normativos já publicados pela Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda.

Essas empresas cumprem requisitos como autorização do Ministério da Fazenda, políticas de compliance, prevenção à lavagem de dinheiro e proteção ao consumidor — inclusive com barreiras técnicas para impedir o acesso de menores de idade.

O problema não está nas plataformas que atuam dentro da legalidade, mas sim na divulgação de sites não licenciados, sediados em jurisdições pouco transparentes ou que adotam práticas enganosas ou não seguem a regulamentação já existente para o setor.

Nesses casos, a publicidade pode transbordar para o ilícito, e o influenciador, que muitas vezes não checa a idoneidade da empresa, acaba assumindo riscos jurídicos desnecessários.

E há ainda, os casos em que influenciadores, em “liberdade poética” podem induzir o público ao erro, omitir informações relevantes, disfarçar publicidade como opinião ou promover condutas ilegais — como jogos de azar sem licença ou promessas enganosas de retorno financeiro, mas essa liberdade do influenciador é protegida, mas também limitada.

Influenciador, o novo elo da cadeia de consumo: jurisprudência em Construção.

O trecho citado — qualquer pessoa que atue de forma relevante para o consumo de um produto ou serviço pode ser considerada parte da cadeia de fornecimento — é uma construção doutrinária bem aceita, e encontra respaldo analógico e interpretativo em decisões do STJ sobre a ampliação da cadeia de fornecimento.

E apesar de nenhum julgado ainda ter analisado a responsabilidade dos influenciadores digitais, mas tão somente a responsabilidade solidária entre fornecedores em ambiente tradicional de consumo, podemos adotar a mesma tese de fundo, também, para a situação em que verificada a existência de dano ao consumidor, ocorrido em razão do elo entre influenciador e empresa contratante.

No REsp1955083/BA, o STJ ao analisar a possibilidade de responsabilizar patrocinador de evento em acidente de consumo, fixou a seguinte tese:

“O legislador, com o propósito de conferir proteção mais efetiva às vítimas de acidentes de consumo, ampliou o conceito de fornecedor previsto no art. 3º do CDC , imputando os danos causados pelo defeito a todos os envolvidos na prestação do serviço (art. 14 do CDC ). Ou seja, ao valer-se do vocábulo fornecedor, pretendeu-se viabilizar a responsabilização do terceiro que, embora não tenha prestado o serviço diretamente, integrou a cadeia de consumo. Cuida-se do fornecedor indireto ou mediato.”

 

O acórdão reafirma a extensão do conceito de fornecedor, segundo o qual:

O fornecedor de serviços divide-se em duas categorias: fornecedor direito ou imediato e fornecedor indireto ou mediato. O primeiro, é “aquele que constitui diretamente a relação de consumo com o destinatário final dos produtos e serviços” (LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade civil nas relações de consumo. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 94). Já o fornecedor mediato é “o terceiro que não celebrou o contrato, mas integrou a cadeia econômica como fornecedor do produto ou do serviço” (LISBOA, Roberto Senise. Op. Cit., p. 95).(…) Todos são responsáveis solidários, na medida de suas participações. Haverá, é claro, o prestador do serviço direto que provavelmente venha a ser o acionado em caso de dano. Porém, todos os demais participantes da execução do serviço principal, que contribuíram com seus próprios serviços e seus produtos são, também, responsáveis solidários. (RIZZATTO, Nunes. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, pp. 290-291)”.

 

Ou seja, o STJ admite a responsabilidade solidária entre todos que tornaram possível a relação de consumo, mediante exercício das suas atividades, inclusive quanto a prestação de informação adequada.

Assim, o fornecedor indireto ou mediato, ainda que não tenha firmado diretamente o contrato com o consumidor, pode ser responsabilizado pelo acidente de consumo, caso tenha contribuído para a prestação do serviço que resultou no dano.

E embora o STJ ainda não tenha julgado especificamente um caso envolvendo responsabilização civil de influenciador digital com base no CDC, a analogia jurídica é perfeitamente viável e já vem sendo sustentada em decisões de Tribunais Estaduais e na doutrina contemporânea, até porque hoje o foco tem saído do direito do consumidor para as relações de consumo.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) já analisou casos em que influenciadores digitais foram responsabilizados por danos causados aos consumidores devido à promoção de produtos ou serviços. Um exemplo notável é a Apelação Cível nº 1052135-63.2023.8.26.0002, julgada pela 30ª Câmara de Direito Privado do TJSP.

Nesse caso, uma influenciadora digital e uma empresa de consultoria foram condenadas a indenizar uma seguidora por danos morais, no valor de R$ 5.000,00, devido à propaganda enganosa de um curso online.

A autora da ação adquiriu o curso de marketing digital após ser atraída por uma publicidade que prometia rendimento mínimo diário, o que não se concretizou. A relatora do recurso, desembargadora Maria Lúcia Pizzotti, destacou que a autora foi vítima de graves violações à legislação consumerista perpetradas por pessoa que se utiliza de seu prestígio público para tanto⁶.

Outro caso relevante é o Recurso Inominado nº 1006926-92.2020.8.26.0223, julgado pelo TJDFT. Nesse processo, o tribunal reconheceu que a influenciadora, ao divulgar um produto sem fornecer informações adequadas sobre seus riscos, contribuiu para o prejuízo do consumidor, sendo, portanto, corresponsável.

A decisão enfatizou que os influenciadores digitais, ao utilizarem sua credibilidade para promover produtos ou serviços, assumem uma posição de garantidores em face dos produtos e serviços indicados. Caso as qualidades atribuídas aos produtos e serviços não sejam condizentes com a realidade, o fator de persuasão do influenciador aparece de forma negativa e prejudicial ao consumidor, confrontando os princípios da boa-fé e da confiança⁷.

Um caso de grande repercussão na doutrina foi o julgado do processo nº 0019543-02.2019.8.19.0001, pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Na ocasião, uma consumidora adquiriu um smartphone incentivada pela recomendação de uma influenciadora digital, mas o produto jamais foi entregue, pois tratava-se de um golpe — enquadrado como estelionato, tipificado no art. 171 do Código Penal.

O tribunal entendeu que a atuação da influenciadora foi determinante para a concretização da relação de consumo, de modo que, ainda que não tenha agido com dolo ou culpa direta, assumiu responsabilidade objetiva pelos prejuízos sofridos pela consumidora. A Corte reconheceu que sem a sua recomendação pública, a contratação sequer teria ocorrido, o que a inseriu na cadeia de fornecimento.

Embora os pedidos de indenização por danos morais tenham sido julgados improcedentes, a influenciadora foi condenada à devolução do valor pago pela vítima, justamente por ter contribuído, com sua credibilidade, para legitimar um fornecedor fraudulento. O caso reforça a tese de que a responsabilidade dos influenciadores decorre não apenas de sua intenção, mas do peso que sua imagem exerce na decisão de consumo⁸.

Assim, se o influenciador for pago para divulgar determinado produto, serviço ou plataforma, passa a exercer atividade comercial e participa da cadeia de consumo, afinal, nas palavras de Magesti e Castro, os influenciadores são vistos como “amigos íntimos e parceiros de seus seguidores, quando na realidade são profissionais bem pagos para realizarem anúncios de diversos produtos, sem qualquer preocupação em alertar sobre os possíveis riscos das  mercadorias  que  anunciam.  Ou  ainda,  apenas  alertar  os  seus  seguidores  que  aquele é um anúncio pago e não um conselho de amigos”⁹.

Vulnerabilidade digital: uma nova camada de proteção ao consumidor.

No ambiente digital, a figura do influenciador não pode ser reduzida à de um simples divulgador informal. Quando promove produtos ou serviços, sua atuação assume caráter contratual e publicitário, tornando-o um elo visível e ativo da cadeia de fornecimento. Nessa condição, pode ser responsabilizado como fornecedor, nos termos do art. 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Isso porque todos os que contribuem de forma relevante para o resultado lesivo respondem solidariamente, nos termos do art. 7º, parágrafo único, do CDC. É nesse cenário que surge um novo olhar: a vulnerabilidade digital do consumidor.

A vulnerabilidade, como categoria jurídica prevista no CDC (art. 4º, I), vai além da técnica, jurídica ou econômica. No ambiente digital, há uma camada adicional: a vulnerabilidade informacional e algorítmica. Trata-se da exposição do consumidor a conteúdos que exploram fragilidades emocionais e padrões de repetição alimentados por algoritmos.

Essa exposição intensifica o desequilíbrio da relação de consumo, especialmente quando direcionada a públicos jovens, emocionalmente impressionáveis ou em situação de instabilidade financeira.

Como mensurar essa vulnerabilidade digital? A resposta está no contexto. É necessário observar se o consumidor foi exposto a promessas sistemáticas de enriquecimento rápido, se a publicidade era disfarçada de conteúdo pessoal, se havia omissão de riscos ou ausência de clareza sobre a natureza da atividade promovida.

Nesse sentido, cabe uma ressalva: considerando o contexto atual de revolução tecnológica, já não se mostra adequado tratar apenas de “direito do consumidor”, mas sim de “relações de consumo”. Com essa mudança de paradigma, a responsabilização do fornecedor não pode ocorrer de forma automática, como ainda se observa em diversas situações.

É preciso verificar a assimetria de informação e o maior poder de convencimento do influenciador, pois neste cenário maior também o seu dever de cautela.

A boa-fé objetiva, princípio norteador das relações de consumo, exige transparência, responsabilidade e ética na comunicação comercial. E, nesse sentido, a negligência do influenciador pode representar não apenas uma falha moral, mas também uma infração jurídica com efeitos concretos para ele e para os consumidores que influencia.

Diga-se, pode, pois para tanto é necessário que o caso seja analisado detalhadamente.

Por certo, divulgar sem verificar se a plataforma é licenciada no Brasil, omitir que se trata de publicidade, prometer ganhos fáceis ou certeiros… são práticas que violam o dever de informação (art. 6º, III, CDC) e a boa-fé objetiva, podendo configurar infração administrativa, civil e até penal como antes dito.

Checklist jurídico para influenciadores.

Uma coisa é certa, o marketing de influência é uma poderosa ferramenta de conversão — e, por isso mesmo, envolve responsabilidades proporcionais ao seu alcance.

No caso da promoção de plataformas de jogos online, essa responsabilidade é ainda mais sensível como vimos, pois se trata de uma atividade altamente regulada, de risco financeiro direto e com potencial de vício.

Abaixo, um checklist com os cuidados mínimos — mas indispensáveis — que influenciadores devem observar para atuar com segurança jurídica e ética nesse setor:

  • Verificar se a plataforma possui autorização para operar no Brasil:

Com a promulgação da Lei nº 14.790/2023, as apostas de quota fixa passaram a exigir autorização do Ministério da Fazenda para funcionar legalmente no país. Isso significa que não basta a plataforma ser “popular” ou “grande no exterior” — ela precisa estar regularizada no Brasil, com sede ou representação no território nacional, além de cumprir requisitos como:

  • Programas de compliance e prevenção à lavagem de dinheiro;
  • Controle de acesso para maiores de 18 anos;
  • Transparência na comunicação com o consumidor.

O influenciador deve consultar diretamente o CNPJ da empresa, seu status de autorização e, preferencialmente, solicitar comprovação formal da regularidade regulatória. Promover plataformas não autorizadas pode implicar corresponsabilidade civil e até penal, especialmente se houver prejuízo aos consumidores.

  • Exigir contratos formais com cláusulas de responsabilidade recíproca.

Antes de fechar qualquer parceria, o influenciador deve exigir um contrato por escrito, com cláusulas claras sobre:

  • Objeto da divulgação;
  • Responsabilidades da plataforma (e do influenciador);
  • Deveres de conformidade com a legislação brasileira;
  • Regras para retirada do conteúdo em caso de irregularidade futura.

Isso não apenas protege o influenciador, como também demonstra diligência ativa, o que pode ser relevante para afastar culpa ou negligência em eventual disputa judicial.

 

  • Sinalizar claramente que se trata de publicidade.

O CONAR e o art. 36 do CDC exigem que toda publicidade seja identificada de forma clara e destacada. Não basta um “#pub” escondido ou genérico, pois pelo princípio da identificação, a menção deve ser explícita.

O público precisa saber, sem dúvidas, que aquele conteúdo é patrocinado. Disfarçar publicidade de opinião pessoal ou “dica de amigo” é conduta enganosa — e tem gerado sanções, tanto por parte de órgãos de autorregulação como em decisões judiciais.

Um documento útil e importante para os influenciadores é o Guia de Publicidade por Influenciadores digitais do CONAR, no qual constam as principais orientações para a aplicação das regras do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária ao conteúdo comercial em redes sociais¹⁰.

  • Inserir disclaimers sobre os riscos inerentes às apostas.

Jogar envolve risco de perda. Por isso, é essencial alertar o público sobre isso com linguagem clara e acessível. Mensagens como:

“Este conteúdo é publicitário. Apostas envolvem riscos e não garantem retorno financeiro. Jogue com responsabilidade.”

…devem acompanhar postagens, vídeos ou transmissões ao vivo que envolvam jogos online. Plataformas sérias já exigem esse tipo de aviso — o que, aliás, é um indicativo de comprometimento com as normas.

  • Evitar conteúdos que romantizem ganhos fáceis ou infalíveis.

Promessas de “ficar rico do dia para a noite” não apenas ferem o bom senso — violam o art. 37 do CDC, que proíbe publicidade enganosa ou abusiva.

A linguagem utilizada deve refletir a incerteza da atividade, evitando frases como:

  • “Ganhe dinheiro sem sair de casa”;
  • “Use meu código e garanta seu lucro”;
  • “Você só perde se não tentar”.

Essas expressões podem induzir o consumidor ao erro e responsabilizar o influenciador por eventuais perdas, ainda que ele mesmo não tenha praticado o golpe.

Conclusão

O avanço das apostas online e a recente mobilização legislativa e judicial sobre o tema deixaram claro que os influenciadores digitais não estão fora do alcance da responsabilidade jurídica, especialmente quando promovem plataformas de apostas — legais ou ilegais —, tornam-se parte de uma cadeia que pode gerar danos reais ao consumidor, especialmente considerando a vulnerabilidade digital de parte significativa da população.

O argumento de que “só estava divulgando” não é suficiente para afastar a responsabilidade objetiva prevista no Código de Defesa do Consumidor. A boa-fé, a confiança do público e o princípio da prevenção exigem que o influenciador avalie com seriedade o que está promovendo.

E a jurisprudência das cortes brasileiras já caminha (ainda em passos tímidos, é fato) para o reconhecimento do influenciador como elo na cadeia de consumo, com a possibilidade de preencher os requisitos do conceito de fornecedor.

Afinal, o que é só mais uma publicação para o influenciador pode ser um prejuízo real para o consumidor — e um processo para ambos, prejudicando, ainda, as empresas sérias do mercado.

Quanto a CPI das Apostas, independentemente de seu resultado, é válido dizer que promover empresas sérias e regulares é legítimo — e pode ser benéfico para todos os envolvidos, justamente para disseminar as informações corretas. Mas isso não exonera o influenciador do dever de fazer sua própria diligência.

A Comissão Parlamentar de Inquérito é instrumento legítimo de fiscalização e apuração, previsto na Constituição Federal (art. 58, §3º), porém, sua efetividade depende de dois fatores: independência política e rigor técnico. Até aqui, os trabalhos da CPI têm gerado visibilidade, mas ainda carecem de desdobramentos concretos — como o encaminhamento de projetos legislativos, sanções exemplares ou diagnósticos preciso dos limites e responsabilidades especialmente dos influenciadores.

A CPI tem uma chance digna de Os Vingadores: reunir forças e agir com estratégia para criar regras claras sobre publicidade digital, definir critérios objetivos de responsabilização para promotores de jogos (influenciadores) e implementar mecanismos de proteção aos consumidores — especialmente os jovens. Se não fizer isso, corre o risco de virar só mais um episódio de O Show de Truman: muito alarde, tudo encenado, mas sem impacto real na vida fora das câmeras.

Além disso, a CPI das Apostas reforçou a necessidade de olhar com mais atenção para o setor — não apenas para coibir abusos, mas também para valorizar as empresas que atuam corretamente e que adotam diversas medidas para propagar o jogo responsável, sendo verdadeira fonte de entretenimento.

Aos influenciadores, cabe entender que a fama digital não é blindagem legal. Ao contrário: quanto maior o alcance, maior o cuidado necessário. Porque, no fim das contas, o maior prêmio é preservar a confiança do público — e o próprio CPF limpo.

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  1.  Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2024/07/para-que-estudar-os-jovens-que-sonham-em-virar-influencers.shtml
  2.  ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Classificação Internacional de Doenças – CID-11. Disponível em: https://icd.who.int/.
  3.  NATIONAL HEALTH SERVICE (UK). “Gambling-related harm: a review.” 2021. Disponível em: https://www.nhs.uk/live-well/addiction-support/gambling-addiction/
  4. Disponível em:  https://exame.com/esporte/com-crescimento-superior-a-360-ramo-de-apostas-esportivas-e-o-mais-forte-do-futebol-brasileiro/
  5.  CONAR. Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, com especial atenção à Seção 11 – Produtos que requeiram cuidados especiais. Disponível em: https://www.conar.org.br/
  6. https://www.tjsp.jus.br/Noticias/Noticia?codigoNoticia=96153#:~:text=Repara%C3%A7%C3%A3o%20por%20danos%20morais%20fixada,fixado%20em%20R%24%205%20mil. Acessado em 13/05/2025.
  7.  https://periodicos.ufpb.br/index.php/rri/article/view/69263/39698. Acessado em 13/05/2025.
  8.  Idem. fl. 82.
  9.  MAGESTE, A. E. S., CASTRO, C. C. R. A Responsabilidade Civil dos Influenciadores Digitais nas Relações de Consumo. Revista Avant, Florianópolis/SC, V.6, n. 2, 379-396, 2022. Disponível em: <https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/243018>. Acesso em: 13/05/2025.
  10. Disponível em http://conar.org.br/pdf/CONAR_Guia-de-Publicidade-Influenciadores_2021-03-11.pdf Acesso em 14/05/2025.

Referências

BRASIL. Constituição Federal de 1988.
BRASIL. Código de Defesa do Consumidor. Lei nº 8.078/1990.
BRASIL. Lei nº 14.790/2023. Dispõe sobre a tributação e regulamentação das apostas de quota fixa.
Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária. Disponível em http://www.conar.org.br/pdf/codigo-conar-2021_6pv.pdf
Guia de publicidade por influenciadores digitais. 2021. Disponível em http://conar.org.br/pdf/CONAR_Guia-de-Publicidade-Influenciadores_2021-03-11.pdf Acesso em 14/05/2025.
De Medeiros Sizenando, E. F., Dantas de Azevedo, M. E., & de Medeiros Torres, S. (2024). A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS INFLUENCIADORES DIGITAIS: UMA ANÁLISE DA DIVULGAÇÃO DE PRODUTOS E JOGOS DE AZAR À LUZ DOS PRINCÍPIOS DO DIREITO DO CONSUMIDOR. Revista Ratio Iuris, [S. l.], v. 3, n. 1, p. 71–86, 2024. Disponível em:
https://periodicos.ufpb.br/index.php/rri/article/view/69263. Acesso em: 13 maio. 2025.
TJSP, 1052135-63.2023 .8.26.0002, Relator.: Maria Lúcia Pizzotti, Data de Julgamento: 23/01/2024, 30ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 23/01/2024.
Resolução 163/2022 do CONANDA. Disponível em:
https://criancaeconsumo.org.br/chega-de-publicidade-infantil/publicidade-infantil-e-ilegal/resolucao-163-do-conanda/
Superior Tribunal de Justiça – REsp1955083/BA.
MIRAGEM, Bruno. Manual de Direito do Consumidor. São Paulo: RT, 2023.
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 9. ed. São Paulo: RT, 2022.
CÉSAR, Rhuana. A fama e os influenciadores digitais: Desafios e responsabilidades jurídicas. 2024. disponível em https://www.migalhas.com.br/depeso/410977/fama-e-influenciadores-digitais-desafios-e-responsabilidade-juridica
César, Rhuana. Poder e responsabilidade do influenciador digital, implicações éticas e CDC, 2023. disponível em https://www.conjur.com.br/2023-jun-30/rhuana-rodrigues-cesarresponsabilidadeinfluencers/#:~:text=Os%20influenciadores%20devem%20assumir%20a,quando%20o%20assunto%20%C3%A9%20responsabilidade.

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