Por João Pedro Mamede Miranda
A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei 13.709/2018 – “LGPD”) trouxe uma série de desafios para as empresas brasileiras e estrangeiras atuando no Brasil, especialmente para aquelas que lidam com dados sensíveis, como é o caso das farmacêuticas. Nesse contexto, a gestão do Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) torna-se um ponto crucial, uma vez que é por meio desse canal que as empresas recebem uma grande quantidade de dados não estruturados das mais diversas naturezas .
O SAC é um canal de comunicação direta entre a empresa e o consumidor, onde este pode registrar eventos adversos, fazer reclamações, solicitações, sugestões e até mesmo elogios. No setor farmacêutico, os dados recebidos comumente variam desde informações básicas de contato até dados sensíveis de saúde. Portanto, é fundamental que as empresas estejam preparadas para lidar com essas informações de maneira adequada, respeitando as regras de privacidade e os direitos dos titulares.
Um dos primeiros passos para garantir a proteção de dados pessoais no SAC é treinar a equipe de atendimento. É essencial que os atendentes estejam cientes das regras da LGPD e saibam como aplicá-las no dia a dia, triando os temas que são de competência histórica do SAC (relações de consumo, informações, etc) e, eventualmente, direcionando outros à equipe de privacidade. Esse treinamento requer, além do conhecimento das normas legais, a prática de ações que garantam o tratamento ético e seguro dos dados dos consumidores.
Os atendentes precisam estar preparados para identificar quais dados são considerados sensíveis pela LGPD, como informações sobre saúde, e ter claro que esses dados requerem um nível de proteção ainda mais rigoroso. Além disso, devem ser orientados a coletar apenas as informações estritamente necessárias para a prestação do serviço solicitado pelo consumidor, minimizando assim os riscos associados ao tratamento de dados pessoais.
Outro ponto importante é a inclusão de avisos de privacidade nos canais de SAC. Esses avisos devem informar aos consumidores sobre como seus dados serão utilizados, por quanto tempo serão armazenados e quais são seus direitos em relação a esses dados. Além disso, é importante que os avisos sejam claros e de fácil compreensão, para que os consumidores possam tomar decisões informadas sobre o uso de seus dados.
Esses avisos podem estar presentes em todas as formas de contato do SAC, sejam elas no roteiro de atendimento do telefone, e-mail, chat online, formulários ou redes sociais. A transparência sobre o tratamento dos dados fortalece a confiança do consumidor na empresa e demonstra o compromisso da farmacêutica com a privacidade e a segurança da informação, objetivamente cumprindo com o princípio do livre acesso determinado pela LGPD.
Além dessas medidas, é crucial dispor de um sistema de segurança robusto para proteger os dados contra acessos não autorizados. Isso inclui o uso de tecnologias de criptografia, firewalls e sistemas de detecção de intrusões, além de políticas de acesso restrito a funcionários devidamente autorizados e treinados.
A segurança dos dados também envolve a criação e manutenção de backups regulares, garantindo que informações importantes não sejam perdidas em caso de falhas técnicas ou incidentes de segurança. É fundamental que esses backups sejam armazenados de forma segura e que sua recuperação possa ser feita rapidamente, minimizando interrupções no serviço.
A implementação de medidas de proteção de dados pode levar a melhorias nos processos internos da empresa. Ao revisar e otimizar a maneira como os dados são coletados, armazenados e processados, as farmacêuticas podem identificar ineficiências e áreas para melhorias, resultando em maior eficiência operacional e redução de custos.
Outro aspecto importante consiste na existência de plano de resposta a incidentes bem definido. Esse plano deve estabelecer procedimentos claros para identificar, conter, erradicar e recuperar dados em caso de vazamento ou qualquer outro tipo de incidente de segurança. A existência de um plano eficaz pode mitigar os danos e garantir uma resposta rápida e adequada às emergências.
O plano deve ser regularmente testado e atualizado para refletir as melhores práticas de segurança e as mudanças no ambiente de TI e nas ameaças cibernéticas. Além disso, deve incluir a comunicação adequada com os consumidores afetados por um incidente, informando-os sobre o que aconteceu, quais medidas estão sendo tomadas para resolver o problema e como eles podem proteger suas informações pessoais, quando aplicável.
Vale lembrar que – na imensa maioria das vezes – o SAC das indústrias farmacêuticas é assegurado por uma empresa terceirizada que atua na qualidade de Operador de dados pessoais. Nesse contexto, a equipe de privacidade deve ser envolvida na relação jurídica de forma a assegurar que todas as precauções acima não só figuram expressamente no contrato como como obrigação do Operador mas, também, são verificadas na prática.
Com efeito, a proteção de dados pessoais no SAC é um desafio que exige atenção constante das farmacêuticas para garantir o cumprimento da LGPD e proteger os direitos dos titulares/consumidores.
Contudo, a conformidade com a LGPD não deve ser vista apenas como um ônus, uma obrigação legal. Ela também fornece uma oportunidade ímpar para as empresas demonstrarem seu compromisso com a privacidade e a proteção de dados e melhorar a confiança dos consumidores. Ela ajuda a construir uma reputação positiva para a empresa, mostrando aos clientes e ao mercado que a organização se preocupa com a privacidade e a segurança das informações que lhe são confiadas. Isso pode resultar em maior fidelização dos clientes e uma vantagem competitiva no mercado.
Nesse sentido, as farmacêuticas podem transformar um desafio em uma oportunidade para aprimorar suas práticas, fortalecer sua reputação e construir uma relação de confiança duradoura com seus clientes. O compliance com a LGPD é, definitivamente, uma atitude favorável aos negócios.
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