Por Andressa Melgaço da Cunha
A recente publicação da Portaria MTE nº 3.665/2023, em 20 de dezembro de 2024, introduziu alterações significativas no regramento do trabalho em feriados, com impactos diretos sobre as atividades do comércio, dos serviços e, especialmente, das operações contínuas. A nova norma revogou dispositivos anteriores que permitiam o funcionamento automático de diversos setores em feriados, tornando obrigatória, a partir de 1º de julho de 2025, a autorização expressa por convenção coletiva de trabalho, observada ainda a legislação municipal aplicável.
Essa mudança normativa exige das empresas um reposicionamento estratégico. Modelos de operação anteriormente sustentados por permissivos normativos genéricos, como os previstos na Portaria nº 671/2021, deverão agora ser reavaliados sob a ótica da negociação coletiva, sob pena de exposição a autuações fiscais e à judicialização trabalhista.
A revogação dos anexos infralegais que anteriormente dispensavam negociação sindical para o trabalho em feriados representa, na prática, uma ruptura com o regime anterior de permissividade. Setores como varejo, supermercados, farmácias, shoppings centers e serviços essenciais, que tradicionalmente mantêm atividades nesses dias, passam a depender, necessariamente, de autorização convencional específica. A ausência dessa previsão impede a manutenção das operações em feriados, criando riscos jurídicos relevantes, inclusive com potencial para o reconhecimento de labor extraordinário, reflexos remuneratórios e indenizações por danos extrapatrimoniais.
Além da necessidade de readequação operacional, a nova regra impõe desafios à dinâmica das negociações coletivas. A obrigatoriedade de pactuação com o sindicato profissional pode gerar entraves operacionais, especialmente em categorias marcadas por histórico de conflitos, ausência de representatividade ativa ou demora nos trâmites de celebração de convenções. Soma-se a isso o impacto econômico: as tratativas sindicais tendem a envolver contrapartidas, como pagamento de adicionais, folgas compensatórias ou benefícios específicos, que elevam o custo de operação em feriados e exigem replanejamento orçamentário por parte das empresas.
Nesse cenário, a atuação preventiva torna-se imperativa. A inobservância da nova regulamentação poderá ensejar autuações por parte da fiscalização do trabalho e impulsionar o ajuizamento de ações trabalhistas, com pleitos voltados à reparação de jornadas indevidas e supressão de direitos legais.
Do ponto de vista dos trabalhadores, a medida pode limitar o acesso a rendimentos variáveis vinculados ao trabalho em feriados. Contudo, sob a ótica jurídica, a exigência de convenção coletiva reforça a valorização do descanso remunerado e da negociação entre as partes, promovendo maior equilíbrio e transparência nas relações de trabalho.
Turno Ininterrupto de Revezamento: Riscos e Estratégias de Conformidade
As implicações da Portaria nº 3.665/2023 são ainda mais sensíveis para empresas que operam sob regime de turno ininterrupto de revezamento, realidade comum nos setores industrial, de energia, saúde e logística. Nessas atividades, a paralisação nos feriados é, em muitos casos, impraticável do ponto de vista técnico e social, o que impõe a necessidade de planejamento jurídico-operacional acurado.
Para garantir conformidade normativa e mitigar riscos, recomenda-se atenção redobrada a quatro frentes principais:
- Revisão dos instrumentos coletivos vigentes: É essencial verificar se os acordos ou convenções da categoria contemplam expressamente a possibilidade de trabalho em feriados. Caso contrário, deve-se iniciar desde já tratativas com o sindicato, visando assegurar respaldo formal a partir de julho de 2025.
- Adequação das escalas de revezamento: Mesmo os regimes escalonados devem estar amparados por cláusulas convencionais que autorizem o labor em feriados. Escalas implementadas sem essa previsão podem ser consideradas nulas e ensejar penalidades administrativas, além de passivos trabalhistas consideráveis.
- Capacitação das lideranças e do setor de RH: É imprescindível que gestores, coordenadores e profissionais de recursos humanos estejam plenamente atualizados quanto à nova regulação, evitando falhas na gestão de jornada, registros de ponto e compensações devidas.
- Atuação jurídica preventiva e contínua: Diante da complexidade regulatória e do potencial de litigiosidade, o assessoramento jurídico especializado deve ser constante, com foco na adequação dos instrumentos coletivos, políticas internas e controles operacionais à nova realidade normativa.
Dessa forma, podemos concluir que a Portaria nº 3.665/2023 consolida uma guinada normativa em direção à centralização da negociação coletiva como principal instrumento de validação do trabalho em feriados. Se, por um lado, esse movimento valoriza o diálogo social e fortalece a proteção aos direitos dos trabalhadores, por outro, impõe desafios operacionais e jurídicos às empresas — que passam a depender, ainda mais, de planejamento, articulação sindical e suporte jurídico qualificado.
Empresas com atividades ininterruptas devem se antecipar. A reavaliação dos instrumentos coletivos, a reestruturação das escalas de revezamento e a abertura de canais de diálogo com os sindicatos são medidas essenciais para assegurar a continuidade das operações e a segurança jurídica das relações laborais.
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Referências:
- Ministério do Trabalho e Emprego – Portaria nº 3.665/2023 (texto oficial):
🔗 https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-3.665-de-13-de-novembro-de-2023-520831811 - Nota Técnica do MTE sobre a vigência e prorrogação da Portaria:
🔗 https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/noticias-e-conteudo/2024/Dezembro/portaria-sobre-trabalho-em-feriados-entrara-em-vigor-em-julho-de-2025 - Fecomércio MG – Análise sobre impactos no comércio:
🔗 https://fecomerciomg.org.br/noticias/decisao-sobre-o-trabalho-nos-feriados-e-adiada-novamente-pelo-mte/ - Objetiva Consultoria – Efeitos financeiros da nova regra:
🔗 https://objetivaconsultoria.com.br/portaria-3-665-2023-mudancas-para-o-trabalho-aos-domingos-e-feriados-aumentando-custos-e-exigindo-adaptacoes-das-empresas/