Artigos - Postado em: 07/01/2019

Nova lei flexibiliza sociedade, mas pode trazer insegurança a minoritário

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A Lei nº 13.792/19, publicada no Diário Oficial da União dia 4 de janeiro de 2019, traz mais flexibilidade às relações societárias das companhias limitadas e maior poder aos sócios majoritários, privilegiando o regular funcionamento da sociedade em detrimento à proteção do sócio minoritário.

Essa maior flexibilidade é primeiramente verificada na alteração promovida pela citada lei ao artigo 1.063, parágrafo primeiro, do Código Civil, reduzindo, de dois terços para mais da metade do capital social, o quórum mínimo para destituição de administrador-sócio nomeado no Contrato Social de Sociedade Limitada — sem impedir que os sócios pactuem, se assim desejarem, qualquer quórum maior do que esse no Contrato Social. A redução do quórum obrigatório para destituição do administrador é particularmente útil em caso de divergências entre sócios quando houver sócio(s) representando mais de metade do capital social, pois permite que esse(s) sócio(s) majoritário(s) destitua(m) o sócio minoritário do cargo de administrador, evitando dessa forma eventuais danos à gestão da sociedade e à sua operação como um todo. Tais danos poderiam decorrer de uma longa disputa entre o(s) sócio(s) majoritário(s) e o administrador. Isso limita também, nessas hipóteses, o risco de que sócio minoritário exercendo o cargo de administrador exija o pagamento de elevadas somas da sociedade ou dos sócios majoritários para aceitar assinar a alteração de Contrato Social que o destitui do cargo.

Também no tocante à alteração feita ao parágrafo único do artigo 1.085 do Código Civil, verifica-se maior flexibilidade e desburocratização. Esse parágrafo único estabelecia que a exclusão de sócio minoritário em qualquer sociedade somente poderia ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para tal, dispondo o sócio a ser excluído de tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa, mas isso agora passa a aplicar-se apenas a sociedades que tenham a partir de três sócios. A eliminação da necessidade da convocação de uma reunião de sócios para sociedades com apenas dois sócios elimina uma burocracia desnecessária, partindo do princípio de que seria dispensável uma reunião formal apenas com o sócio a ser excluído. A nova redação permite assim mais rápida exclusão do mesmo em casos em que o sócio majoritário entenda que o minoritário estaria pondo em risco a continuidade da empresa em virtude de atos de inegável gravidade. Percebe-se claramente uma intenção de preservar, da mesma forma, o bom funcionamento da empresa, limitando a duração de querelas societárias que poderiam prejudicá-la como um todo. Também nesse caso limita-se o risco de que sócios minoritários requeiram o pagamento de valores para aceitarem assinar a alteração de Contrato Social que os retira da sociedade.

No entanto, as referidas alterações promovidas pela Lei nº 13.792/19, sob o ponto de vista do sócio minoritário, podem ser entendidas como fonte de insegurança jurídica. Esta insegurança decorre, com relação à destituição do administrador, da possibilidade do sócio minoritário ser destituído mais facilmente desse cargo, já que um quórum menor é agora requerido para tal. Isso pode ser particularmente arriscado para o sócio minoritário que tiver sido nomeado administrador da sociedade antes da promulgação da Lei nº 13.792/19 e que detém entre mais de um terço e metade do capital social da sociedade, pois o mesmo anteriormente não poderia ser destituído do cargo sem o seu próprio consentimento, e agora poderá sê-lo.

Essa maior insegurança jurídica do sócio minoritário também ocorre com relação à sua exclusão da sociedade, já que, nas sociedades de apenas dois sócios, o mesmo não dispõe mais do mecanismo de defesa em reunião de sócios obrigatório que a antiga redação do parágrafo único do artigo 1.085 do Código Civil lhe conferia, e, portanto, poderá estar mais inclinado a recorrer ao Poder Judiciário para poder fazer valer os seus direitos societários. Será portanto crucial que sejam muito bem determinados pelo sócio majoritário os atos de inegável gravidade justificando a exclusão do sócio minoritário, até mesmo como preparação para eventual defesa na esfera judicial.

Vale também lembrar que, a despeito do Código Civil em vigor, que já previa claramente hipóteses de atos societários que não necessitam da assinatura de todos os sócios, como o artigo 1.076, alínea I, que estabelece quórum de pelo menos três quartos do capital social para alterações de Contrato Social, algumas Juntas Comerciais têm resistido de forma reiterada a registrar quaisquer alterações de Contrato Social que não contenham a assinatura de todos os sócios. Outras Juntas Comerciais hesitavam em aceitar a destituição de sócio nomeado administrador no Contrato Social por quórum menor do que três quartos do capital social, justamente em razão da alínea I do artigo 1.076 — sob o argumento de que o artigo 1.076 seria de aplicação geral —, apesar de a antiga redação do artigo 1.063 já prever que a destituição do sócio administrador poderia ocorrer por quórum de dois terços do capital social.

Tendo em vista que a Lei nº 13.792/19 não alterou a alínea I do artigo 1.076 do Código Civil, é possível que as Juntas Comerciais em questão continuem relutando em aceitar alterações contratuais com quóruns inferiores a três quartos do capital social — apesar das disposições expressas da nova lei —, sendo provável que algumas delas continuem insistindo na assinatura de todos os sócios. É portanto importantíssimo que haja, com a maior brevidade, um posicionamento formal do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI) a respeito.

Philippe Boutaud-Sanz é sócio do Chenut Oliveira Santiago Advogados.

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