O direito sindical no Brasil está prestes a ganhar um novo capítulo!
A contribuição assistencial, que é uma taxa paga pelos trabalhadores filiados a um sindicato para custear atividades específicas da entidade, tais como a realização de assembleias, as negociações coletivas e outras despesas administrativas, é normalmente imposta através dos próprios instrumentos coletivos (Convenção Coletiva de Trabalho ou Acordo Coletivo de Trabalho).
Sobre esta parcela tem-se que o STF já tomou algumas decisões relevantes nos últimos anos. Em 2018, o Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional a cobrança da contribuição assistencial dos trabalhadores não sindicalizados, ou seja, aqueles que não são filiados ao sindicato. Assentou, na oportunidade, o entendimento de que seria inconstitucional a imposição desta parcela a empregados não sindicalizados através de acordo, convenção coletiva de trabalho ou sentença normativa.
Tal decisão foi duramente criticada por aqueles que defendem a necessidade do custeio das atividades sindicais por todos àqueles que se beneficiam das negociações que, como sabido, não se limitam aos associados.
Já para outros, essa decisão foi vista como uma vitória, especialmente pelos defensores da liberdade sindical, que alegam que a obrigatoriedade da contribuição fere o direito do trabalhador de escolher com quem deseja se associar.
Neste caminhar, em 2020, o STF decidiu que a contribuição assistencial somente poderia ser descontada daqueles trabalhadores que expressa e individualmente autorizassem o desconto, não reconhecendo como válida a autorização coletiva dada em Assembleia Geral, ainda que convocada especificamente para esse fim.
Com a obrigatoriedade de autorização prévia e individual, os sindicatos precisaram, sem sombra de dúvidas, se esforçar mais para conquistar a adesão dos trabalhadores e justificar sua relevância na defesa dos interesses da categoria.
Alguns deles passaram, inclusive, de maneira ‘pouco republicana’, a condicionar a assinatura de instrumentos coletivos à manutenção de cláusulas que garantissem os descontos obrigatórios da contribuição assistencial (também chamada de taxa de fortalecimento sindical ou taxa negocial); e sem a possibilidade de o empregado se opor à tal desconto.
Também passaram a adotar a imposição de valores a serem pagos aos Sindicatos profissionais pelas empregadoras, em nítida inobservância à vedação da ingerência destas na entidade sindical dos empregados. Essa é a regra imposta pela Convenção 98 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) regularmente ratificada pelo Brasil em 1952.
Somado a isso, importa lembrar que a contribuição sindical obrigatória, ou imposto Sindical, que correspondia ao desconto anual de 1 dia de trabalho, e cujo montante era destinado ao financiamento dos sindicatos, federações, confederações e ao Ministério do Trabalho, tornou-se facultativo em 2017, com o advento da Reforma Trabalhista.
Vale ressaltar que essa mudança na obrigatoriedade da contribuição sindical foi uma das alterações mais controversas da reforma trabalhista, aprovada em 2017, mormente porque alguns sindicatos dependiam dessa fonte de receita para manter suas atividades.
Por outro lado, defensores da reforma trabalhista argumentaram que a contribuição sindical obrigatória era um modelo ultrapassado e que não incentivava os sindicatos a buscarem a satisfação dos trabalhadores, já que não precisavam competir pelo seu apoio ou, até mesmo, justificar o recebimento através de sua atuação.
Não há dúvidas, portanto, de que essas decisões do STF, somando à mudança afeta ao imposto sindical, trouxeram impacto direto no financiamento dos sindicatos e na relação com os trabalhadores filiados, ou não.
Curiosamente, na contramão deste esvaziamento sem qualquer transição de custeio, tem-se que também na Reforma Trabalhista, fora ampliado, pela primeira vez, os poderes na negociação coletiva. De forma expressa, passa a autorizar a flexibilização de alguns direitos mediante a negociação coletiva que, inclusive, nos temas lá destacados, poderá se sobrepor a própria norma legal.
O que se viu de lá até os dias atuais, é o encerramento das atividades de diversos sindicatos, especialmente representantes dos empregados, pela completa falta de recursos financeiros para dar continuidade às suas atividades.
E neste cenário que delineava a extinção dos Sindicatos, ressai novo julgamento, pelo STF, dos Embargos de Declaração na ARE 1.018.459 neste mês de abril em atenção à citada decisão de 2018.
O julgamento destes embargos aclarátorios se iniciou em 08/2020, com o Ministro Relator, Gilmar Mendes se manifestando pela rejeição, acompanhado pelo Ministro Marco Aurélio, tendo o Ministro Dias Toffoli pedido destaque. Com isso, remetido o julgamento para sessão presencial, Gilmar acabou sendo acompanhado por Dias Toffoli, Nunes Marques e Alexandre de Moraes, divergindo Edson Facchin que acolhia os embargos sem efeitos modificativos. Com 6 votos e maioria pela rejeição, pede vista o Ministro Luis Roberto Barroso que, após apreciar a matéria, traz uma nova perspectiva sobre o tema.
Em 14/04/2023, manifesta Barroso pelo acolhimento dos embargos com efeitos modificativos passando a reconhecer a constitucionalidade da imposição e cobrança da contribuição assistencial a todos os trabalhadores, inclusive aos não sindicalizados, desde que estes não se oponham.
No seu entender, a mudança de entendimento tem razão de ser porque o inicialmente adotado fora embasado em uma realidade distinta da atualmente existente, especialmente após a reforma trabalhista e os impactos funestos das alterações de custeio do Sindicato por ela impostas. Defendeu Barroso em seu voto a necessidade da evolução do entendimento firmado pela Corte Suprema para alinhá-lo com os preceitos Constitucionais.
O que parecia ser uma navegação solitária do Ministro Barroso, acabou por alterar totalmente o rumo deste julgamento.
Após seu voto, o Relator, Gilmar Mendes, alterou o seu entendimento para acolher os aclarátorios com efeitos infringentes e admitir a cobrança da contribuição assistencial, adotando a tese inaugurada pelo Ministro Barroso. Acompanharam, portanto, esse novo entendimento a Ministra Cármem Lúcia e os Ministros Luís Roberto Barroso, Marco Aurélio, Edson Fachin e Dias Toffoli, formando assim maioria antes mesmo do encerramento do julgamento que estava pausado ante o pedido de vista do Ministro Alexandre de Moraes.
Com esse novo entendimento que se avizinha, não á dúvidas de que os Sindicatos voltarão a buscar, através das negociações coletivas o ‘custeio perdido’, o que certamente contribuirá para um expressivo aumento nas negociações coletivas.
Para aquelas empresas que dependem da negociação sindical para estabelecer condições mais específicas afetas ao seu dia a dia, esta será a hora de casar sua necessidade com o interesse em negociar que os Sindicatos, especialmente os dos empregados, certamente terão.
Comece a escrever suas necessidades e o que estaria disposto a ceder para atingi-las. Busque o Sindicato profissional. Para as empresas que mantém empregados atuando externamente, mas ainda sim controlam suas jornadas como, p.ex., as empresas de logísticas, pode ser a oportunidade que faltava para regularizar a adoção daquele tipo de registro eletrônico de ponto que necessita da negociação coletiva.
Mas vá preparado para ‘sentar à mesa’ e anuir com a imposição de cobranças aos empregados, devendo ficar atento apenas a manutenção do direito de oposição dos não sindicalizados. Outra dica importante é não ceder às pretensões eventualmente surgidas de custeio, pelo empregador, ao sindicato profissional.
Com certeza trata-se de uma grande mudança, mas que da própria narrativa acima resta evidenciada a possibilidade de revisão em algum momento da história, portanto, se esta é sua necessidade, corra!
*Mariana Machado Pedroso, especialista em Direito do Trabalho, é sócia de Chenut Oliveira Santiago Advogados